Presidência Solta Presumível Assassino Chinês

Por Nelson Sul D’Angola:
 

A Presidência da República, por via dos serviços prisionais do Ministério do Interior, terá posto em liberdade o cidadão chinês Zang Yan, acusado de ter matado, em Novembro de 2010, o cidadão angolano Pedro Chiwila Nguli, na cidade de Benguela.

Com duração de mais de um ano, o julgamento deveria ter sido concluído a 3 de Setembro passado, com a leitura da sentença. O tribunal chegou a um veredicto, segundo o qual o Zang Yan cometeu o crime e se apossou de US $30 000 que a vítima transportava consigo, tendo de seguida fugido de Benguela.

Testemunhas afirmaram que Zang Yan havia solicitado a Pedro Chiwila Nguli, um cambista de rua (prática conhecida em Angola como “kínguila”), a quantia de US $30 000, para compra. Este recolheu os valores junto dos seus colegas e, a 19 de Novembro de 2010, encontrou-se com o comprador. O cidadão chinês terá proposto um local mais discreto para a realização do volumoso câmbio, segundo informações prestadas por Manuel Nguli, irmão do malogrado, ao Maka Angola.

Pedro Chiwila Nguli não mais foi visto vivo. O seu corpo foi encontrado com sinais visíveis de tortura e esfaqueamentos múltiplos, a 26 de Novembro de 2010, junto ao estádio do Ombaka.

As autoridades policiais detiveram Zang Yan na segunda semana de Março de 2011, e o Ministério Público acusou-o formalmente de crime de homicídio voluntário, remetendo o caso para o Tribunal Provincial de Benguela.

Apesar de ter sido provado, em tribunal, a autoria do crime de homicídio de Pedro Chiwila Nguli, o juiz acabou por não proferir a sentença, devido à transferência do réu para outra jurisdição.

Segundo fonte judicial, o tribunal deveria ter proferido a sentença a 3 de Setembro corrente. No entanto, no início da audiência, no mesmo dia, o juiz Tupita Tobias recebeu um documento da Comarca Provincial de Benguela a informá-lo sobre a transferência do réu para Luanda, dias antes, por “orientações superiores”.

De acordo com a mesma fonte, os magistrados já se encontravam sob pressão de altas figuras da presidência, no sentido de garantir que a sentença favorecesse a libertação do chinês.

Um alto funcionário do Tribunal Provincial de Benguela, que preferiu o anonimato por razões de segurança, afirmou ao Maka Angola que a transferência do cidadão chinês foi feita à revelia e sem qualquer fundamento legal. De acordo com o referido funcionário, “do ponto de vista legal só os juízes têm competência para ordenar a transferência do recluso de uma unidade prisional para outra”.

“Hoje, mais do que nunca, tive a absoluta certeza de que é necessário fazermos uma reforma profunda do nosso sistema [judiciário], que cada vez mais se vai tornando numa espécie de departamento do poder político”, asseverou o mesmo funcionário.

Por sua vez, o académico e especialista em relações internacionais, Alexandre Mendonça, solicita uma reacção pública sobre o caso.

“O réu só deixa de estar sob a alçada do juiz depois de ser condenado. Não sendo o caso, em homenagem à honra do tribunal, o juiz Tupita Tubias deve reagir sobre o comportamento dos serviços prisionais, uma vez que os juízes não dependem de qualquer orientação superior”, explicou Alexandre Mendonça.

Maka Angola contactou, por telefone, o director provincial dos serviços prisionais de Benguela, Feliciano Soma, para uma reacção oficial. “Este assunto é de âmbito central. Convém contactar os órgãos centrais, porque nós aqui não temos nada a explicar”, disse Feliciano Soma.

Fonte dos serviços prisionais em Luanda indicou ao Maka Angola que Zang Yan deverá estar já na China.

Em declarações ao Maka Angola, Manuel Canjongo Nguli, irmão do malogrado, revelou a informação prestada pelo magistrado aos familiares da vítima: “O juiz disse-nos que não podia fazer mais nada, uma vez que o caso transitou para outras instâncias.”

Manuel Canjongo Nguli acusou o executivo do presidente José Eduardo dos Santos de “proteger o expatriado em detrimento do nacional”.

“Será que na China o angolano vale mais que o dono da própria terra?”, questionou-se.

O Grande Negócio da China

Desde 2004, as autoridades de Pequim têm concedido mais de US $15 biliões em créditos ao regime do presidente José Eduardo dos Santos para a reconstrução do país. Em troca, a China recebe cerca de 40 por cento da produção de petróleo angolano.

Como parte dos acordos, as empresas chinesas constroem as infra-estruturas solicitadas pelo regime. Para o efeito, as autoridades angolanas permitiram oficialmente a migração laboral de mais de 258 mil cidadãos chineses, um número que actualmente representa 0,29 por cento do total da população angolana. Já praticamente não existe, em Angola, aldeia ou comuna onde não haja cidadãos chineses a viver ou a trabalhar.

Para além dos números oficiais, milhares de cidadãos chineses podem ser encontrados nas ruas das várias cidades angolanas, como vendedores ambulantes de quinquilharias.

Alexandre Mendonça assevera que “o nosso país [Angola] passou a ser um território neocolonizado pela República Popular da China”.

O jovem Pedro Chiwila Nguli deixou viúva e três filhos.

 

 

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