Manual do Democrata Insatisfeito

A democracia não são só as eleições. O processo democrático não se esgota no dia em que depositamos o nosso voto. Se assim fosse, não teríamos uma democracia, mas uma ditadura electiva. Na realidade, a democracia é um processo que dá expressão à vontade soberana do povo através de vários mecanismos, constituindo uma continuidade de participação e decisão, procurando alargar o espectro dos contributos dos cidadãos. As manifestações ou a emissão de opiniões nas redes sociais, desde que dentro do contexto da ordem constitucional, são instrumentos de participação democrática. Mas existem muitos outros. O que aqui se pretende abordar são as vias legais para o avanço da democracia. A Constituição e a legislação angolanas contêm uma variedade assinalável de procedimentos legais de cariz democrático, cujo uso é tão ou mais importante do que a própria votação em dia de eleições, uma vez que a democracia depende, acima de tudo, da […]

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A Escolha do PGR: entre o Roto, o Nu e a Esperança

Para a recente nomeação do novo procurador-geral da República (PGR), o presidente tinha ao seu dispor três opções: o nu, de que já vimos tudo, o roto, de que víramos apenas uns pedaços, e a esperança, que abria novos caminhos e possibilidades. O presidente da República (PR) escolheu o nu, o general Hélder Pitta Groz. Há 21 anos que o cargo de PGR é entregue a um general. Já parece tradição. Em cinco anos de combate à corrupção, o general Hélder Pitta Groz teve o mérito de obter apenas uma condenação relevante com trânsito em julgado (Augusto Tomás). Sobre ele não há nada a esconder. Possivelmente, o presidente da República julga que melhor é impossível. Triste engano. Só é possível melhor. João Lourenço insiste em não seguir as votações dos Conselhos e nunca opta por aquele que tem mais simpatia colegial, retirando significado a estas eleições. O Conselho Superior da […]

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Paralisia e Nova Constituição

Aproxima-se a inauguração do ano judicial de 2023, mas a justiça paralisou. O procurador-geral da república (PGR) está demissionário, enquanto o presidente do Tribunal Supremo se encontra desacreditado, debaixo de fortes suspeitas na opinião pública. A cerimónia de início do no judicial em Março, a realizar-se nestes termos, será digna de uma novela surrealista: uma liturgia solene dirigida por um presidente da República atónito, rodeado por duas inexistências institucionais, num momento em que a magistratura judicial atravessa uma crise de credibilidade nunca antes vivida, nem sequer no tempo dos tribunais populares colectivos dirigidos por alfaiates, que talvez tivessem o bom senso que agora falta. A par disto, a Assembleia Nacional terá iniciado procedimentos com vista ao apuramento dos factos relativamente aos gastos da presidente do Tribunal de Contas, Exalgina Gamboa. Não se trata aqui de atribuir culpas nem de proferir juízos de valor sobre incompetência ou acusações de corrupção, mas […]

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Angola sem Procurador

O país está sem procurador-geral da República (PGR) há um mês, desde que, a 16 de Dezembro passado, o general Pitta Groz cessou o seu mandato de cinco anos. Estamos assim perante um vazio institucional incompreensível. O presidente da República deve acabar com esse vazio o mais rapidamente possível e travar a regressão que a aplicação da justiça vem sofrendo em Angola. Para isso, e conforme exigido pela lei, João Lourenço deve promover que o Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público (CSMMP) lhe apresente a lista dos três possíveis candidatos a PGR e proceder à sua urgente nomeação. Nos últimos 20 anos, o cargo tem sido sempre confiado a um general, tradição iniciada com Augusto da Costa Carneiro (2002-2007), transmitida a João Maria de Sousa (2007-2017) e, finalmente, a Pitta Groz (2017-2022). Como já antes referimos, na reunião plenária de 16 de Dezembro, o presidente do CSMMP, o mesmo […]

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Ilegalidades na Recondução do Procurador-Geral

Há momentos que definem um mandato. O momento presente vai definir o mandato de João Lourenço e a luta contra a corrupção. Ao reconduzir o procurador-geral da República (PGR), general Hélder Pitta Groz, que se mostrou demasiado incompetente, lento e receoso, criando omissões inexplicáveis, João Lourenço assume esse passivo. Agora, já não se poderá justificar com a incapacidade do pessoal herdado do anterior presidente da República. O falhanço do PGR será o falhanço de João Lourenço – os dois generais ficarão indelevelmente ligados.  O que está em causa nesta situação concreta não são as pessoas, mas o não seguimento do devido processo legal (“due process”). O Estado de Direito assenta na obediência aos pressupostos e requisitos legais e não à vontade das pessoas. A lei justa deve prevalecer. Para existir um Estado de Direito, o fundamental são os princípios, regras e a sua aplicação.  Ora, quer os relatos de fontes […]

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Queixa: A Sonangol e o BAI do Paiva

O BAI, a Sonangol e José Carlos de Castro Paiva estão no centro da denúncia criminal de corrupção e apropriação indevida de bens, hoje apresentada à PGR. Num acto de cidadania e em prol da justiça angolana, endereça-se ao Procurador-Geral da República uma denúncia e um pedido de investigação a José Carlos de Castro Paiva. Para onde foram, afinal, as acções do Banco Angolano de Investimento? Exmo. Senhor Procurador-Geral da República, Tânia de Carvalho e Rafael Marques de Morais vêm expor uma denúncia e solicitar uma investigação criminal a José Carlos de Castro Paiva, baseada nos factos que a seguir se apresenta, os quais, depois de devidamente escrutinados, podem constituir a prática de um ou de vários crimes de índole económico-financeira, bem como violar a Lei da Probidade Pública: 1. O BAI – Banco Angolano de Investimentos foi criado em Novembro de 1996. Nessa data, a Sonangol surgia como principal […]

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A Pré-Puberdade da Independência dos Juízes

Raras vezes uma zaragata é sinal de boas notícias. Contudo, aquela que, neste momento, ocorre entre vários juízes dos tribunais superiores pode ser avaliada, pelo menos parcialmente, como um sinal positivo relativamente à independência dos juízes. No dia 18 de Março passado, o juiz conselheiro do Tribunal Constitucional Carlos Burity da Silva endereçou uma missiva ao presidente desse tribunal, Manuel Costa Aragão, na qual participava disciplinar e criminalmente contra Agostinho Santos (na foto principal), também juiz conselheiro. Na sua carta, Burity acusa Santos de ter uma conduta indecorosa, por designadamente ter concedido uma entrevista a alguns órgãos de comunicação social afirmando discordar com determinado acórdão do Tribunal Constitucional, que decidiu sobre a sua contenda em relação à Presidência da Comissão Nacional Eleitoral. Nessa entrevista, criticando o acórdão 664/21 do ponto de vista jurídico, Agostinho Santos dizia que lhe custava a acreditar que um juiz prestigiado como Simão Victor, um dos […]

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O Banquete Supremo do Joel

Amélia Jumbila Usaú Leonardo Machado deve ser uma pessoa encantadora. Juíza com um ano de experiência, só pôde assumir funções depois de ter sido repescada, uma vez que as suas notas na formação para a magistratura tinham sido demasiado baixas. Perante estes sinais de excelência, foi alegadamente escolhida pelo Conselho Superior da Magistratura Judicial de Angola para frequentar uma formação de formadores em Portugal a partir de 8 de Janeiro próximo. Irá portanto ganhar competências para formar outros juízes. Ou não será assim? Aparentemente, a formação oferecida a Amélia Leonardo corresponde a um curso de um ano na Universidade de Coimbra. Poderíamos começar por discutir por que razão se insiste, nos tempos do combate à corrupção em Angola, em formações académicas em Portugal, país que se confronta com inúmeros problemas nessa área, não sendo certamente um paradigma a seguir. Mas deixemos esse tema para outra ocasião. A deslocação da juíza […]

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A Irresponsabilidade da PGR

Quando surgiu no espaço público uma resposta, com data de 13 de Agosto de 2020, a uma carta rogatória das autoridades judiciárias do Cantão de Genebra, na Suíça, na qual figurava o timbre da Procuradoria-Geral da República de Angola – Gabinete de Intercâmbio e Cooperação Internacional, assinada pelo subprocurador-geral da República André de Brito Domingos, e onde se podia ler, em referência a Carlos Manuel São Vicente, que “em Angola não existem indícios da prática de crimes de Corrupção, Branqueamento de Capitais, Participação Económica em Negócio ou qualquer outro crime”, pensou-se que só poderia tratar-se de mais uma brincadeira semelhante ao famoso passaporte de Bruce Lee nos processos de Isabel dos Santos. Um documento apócrifo ou mal-intencionado, portanto, e nunca um ofício verdadeiro da Procuradoria-Geral de Angola (PGR). Na verdade, menos de um mês depois, a 8 de Setembro de 2020, a mesma PGR anunciava, através do director do seu […]

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A Impossibilidade dos Acordos com Isabel dos Santos

O frenesim continua, desta vez com um putativo anúncio de negociações que estariam a correr entre a Procuradoria-Geral da República de Angola (PGR) e advogados representando Isabel dos Santos, com vista a um acordo global por meio do qual esta devolveria o suposto dinheiro desviado do Tesouro angolano e o Estado poria fim aos vários processos criminais, cíveis, arrestos e outros contra ela. Entretanto, a PGR rapidamente desmentiu a existência dessas negociações, negando-as categoricamente de forma clara e incisiva. Existindo ou não negociações, a verdade é que, por duas razões diferentes – de natureza legal e política – não é possível concretizar um acordo entre o Estado angolano e Isabel dos Santos. Impossibilidade legal Em primeiro lugar, do ponto de vista legal, não há nenhuma legislação que permita à PGR “negociar” acerca de uma panóplia de processos legais e factos tão abrangentes como os que envolvem Isabel dos Santos. Admitindo […]

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