Kadyapemba e FAA Matam Garimpeiro à Pedrada

Passados três dias de buscas após o seu afogamento, o corpo de BernardoMiguel, de 39 anos, foi encontrado ontem na margem do Rio Cuango, no município do Cuango. Foi-lhe dada sepultura ali mesmo, sem autópsia nem caixão. Na Lunda-Norte, o Rio Cuango, suas margens e arredores são um vasto cemitério de garimpeiros.

Do Rio Cuango, que faz navegar frequentemente os corpos inertes e miseráveis dos filhos da terra, também se acarreta a água para beber, cozinhar e alimentar a vida. Este rio é a maior testemunha da violência indescritível e contínua causada pela exploração legal e ilegal de diamantes na região. Essas pedras preciosas são a maior tragédia da população local, cada vez mais empobrecida, mais desumanizada.

A 22 de Agosto, um grupo de mais de 100 garimpeiros trabalhava na margem do Rio Cuango, junto da ponte de Katewe (no lado pertencente ao município de Xá-Muteba). Por volta das 7h00, uma composição indeterminada de soldados das Forças Armadas Angolanas (FAA) e elementos da empresa privada de segurança Kadyapemba surpreendeu os garimpeiros no momento em que comiam o arroz do pequeno-almoço. Logo de seguida, estes homens das FAA e da Kadyapemba atacaram os garimpeiros à pedrada.

Cercados, muitos garimpeiros atiraram-se ao rio, numa fuga precipitada. Segundo testemunho de Charles Oliveira Adriano, alguns dos atacantes estavam tão próximos dos garimpeiros, que um deles atingiu o olho de Bernardo Miguel com uma pedra quando este se fazia à água.

“Ele começou a sangrar no olho e na boca. Ao tentar nadar, começou a engolir água e a afogar-se e a vir à superfície. Com os apedrejamentos contra si e as dores, não conseguiu nadar e afogou-se”, revela Charles Adriano.

Regressados à vila de Cafunfo para comunicar o sucedido aos familiares da vítima mortal, os garimpeiros e populares indignados atacaram um autocarro da Sociedade Mineira do Cuango, a empresa de exploração diamantífera contratante da Kadyapemba. O autocarro recolhia os trabalhadores residentes na vila de Cafunfo.

Um dispositivo da 2ª Esquadra de Cafunfo, da Polícia Nacional, interveio no local e deteve um dos garimpeiros. O autocarro teve de ser escoltado até ao destino por uma composição de militares das FAA, seguranças da Kadyapemba e agentes da Polícia de Intervenção Rápida (PIR) e da Polícia Nacional.

Pouco depois, as autoridades locais ordenaram que o garimpeiro envolvido nas altercações fosse libertado.


José Filipe Muatxinguimbo, tio do falecido, reportou a morte do seu sobrinho na 2ª Esquadra de Cafunfo, onde lhe disseram que deveria apresentar queixa no município de Xá-Muteba. Todavia, foram os próprios garimpeiros quem percorreu as margens do rio ao longo de três dias, à procura do corpo.

É comum ouvir relatos, entre as comunidades locais, segundo os quais os corpos costumam aparecer à superfície, algures nas margens do rio, após três dias de afogamento. Estas comunidades também referem que, na maioria dos casos, a Polícia Nacional não solicita às comunidades que identifiquem os corpos que encontram, enterrando-os nos locais onde são encontrados.

“O governador [Ernesto Muangala] está a dizer que aqui, na Lunda-Norte, não há violação dos direitos humanos. Diz que as empresas privadas de segurança e a tropa do governo não estão a matar nem a bater nos cidadãos locais. Isso é puramente falso, aqui estão a matar muito”, lamenta José Filipe Muatxinguimbo.

Por volta das 17h00 de domingo passado [25 de Agosto], o corpo de Bernardo Miguel foi resgatado, com a presença de bombeiros, de agentes do Serviço de Investigação Criminal e de representantes da Kadyapemba. O enterro teve lugar logo de imediato, na margem do rio, no local onde o corpo foi encontrado, estando presentes alguns familiares e amigos.

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