O Problema da Desvalorização do Kwanza

É um facto que em pouco mais de seis meses o kwanza desvalorizou mais de 40% face ao dólar e ao euro.

A teoria contida nos manuais que os responsáveis por esta desvalorização devem ter estudado diz que esta oscilação cambial negativa torna os produtos angolanos mais baratos e facilita as exportações, levando a um equilíbrio na balança externa e a uma economia mais saudável.

Achamos este postulado de aplicação muito duvidosa na economia angolana. Em Angola, o principal produto de exportação é o petróleo. Na sua esmagadora maioria, os contratos estarão feitos em dólares ou euros, portanto as quebras do kwanza não fazem com que os países comprem nem mais nem menos petróleo angolano, assim como não comprarão nem mais nem menos diamantes ou outras matérias-primas essenciais.

Isto quer dizer, simplesmente, que a referida teoria segundo a qual a desvalorização do kwanza facilita as principais exportações angolanas não se aplica em Angola.

Note-se que a nova economista-chefe do FMI (Fundo Monetário Internacional), Gita Gopinath, professora na Universidade americana de Harvard, tem escrito sobre as ilusões dos benefícios das taxas flexíveis numa economia mundial dominada pelo dólar. Nestes termos, as teorias clássicas sobre flexibilização e desvalorização das moedas nacionais devem ser vistas com renovada atenção e sujeitas a testes práticos.

A isto acrescem alguns efeitos negativos da desvalorização do kwanza que se podem tornar perniciosos para a população.

Para impedir que a desvalorização se torne inflacionista, o Banco Central (Banco Nacional de Angola – BN) tem de proceder a uma contracção da massa monetária em circulação, ou seja, tem de diminuir os kwanzas em circulação em Angola.

Isso faz com que as pessoas tenham menos dinheiro no bolso. Provavelmente, foi essa política que levou a que no leilão de moeda estrangeira de 10 de Outubro passado só tenham sido vendidos cerca de 32% dos dólares disponíveis. Aparentemente, não havia kwanzas.

Ademais, numa economia que necessita de equipamentos, maquinaria e tecnologia – os quais são comprados em moeda estrangeira —, a desvalorização da moeda implica que esses bens a importar fiquem mais caros, o que compromete o desenvolvimento empresarial.

Em resumo, na economia angolana a desvalorização da moeda não aumenta as exportações principais, limitando-se a diminui o poder de compra dos cidadãos. Muitos bens de consumo, sendo importados, tornam-se demasiado caros para a populações e por isso tornar-se-ão indisponíveis. Finalmente, a desvalorização do kwanza constrange o investimento, uma vez quem precisamente, a maior parte dos bens vem do estrangeiro.

Será que se deveria ter deixado o kwanza com um valor elevado face ao dólar, promovendo o mercado negro e não correspondendo à economia real?

A resposta é não. O valor do kwanza deveria ser ajustado. Mas esse ajustamento não se pode fazer como uma medida avulsa e sem se situar num pacote alargado.

Não tem sentido lançar-se a economia numa desenfreada desvalorização do kwanza sem haver um plano completo e abrangente de reforma económica.

Por exemplo, quando o general De Gaulle obteve o poder em França, em 1958, existiam muitos problemas na economia francesa que implicavam a desvalorização do franco francês (a moeda francesa na altura).

De facto, De Gaulle promoveu uma reforma monetária, mas no quadro de um plano mais alargado de índole liberalizadora que ficou conhecido como o Plano Pinay-Rueff. Foi um plano que garantiu anos de equilíbrio orçamental, estabeleceu um “novo franco” após a desvalorização da moeda e confirmou a adopção do livre comércio de França com os seus parceiros europeus. De Gaulle desvalorizou a moeda, mas dentro de um plano global.

O importante a referir é que não se devem tomar medidas desgarradas sem planos simples e consistentes.

É fundamental abandonar esta gestão “tapa-buracos” e desconexa que decorre em Angola e criar uma equipa e um plano económico angolanos que funcionem e garantam crescimento económico sustentado e emprego para todos.

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