A Demissão de Tomás e os Auto-Golos de Lourenço

Finalmente, João Lourenço demitiu Augusto Tomás, o mais contestado dos seus ministros.

Há duas conclusões fundamentais sobre a presidência de João Lourenço que podem retirar-se desta demissão. A primeira é que estamos perante um dirigente que responde positivamente ao coro de críticas justas, assim beneficiando a sua imagem e, por consequência, a do seu governo. Em segundo lugar, João Lourenço demonstra mão firme na demissão das figuras podres do regime do MPLA, já que Tomás é membro do seu Bureau Político. No entanto, muitas das suas nomeações acabam por ser auto-golos, depois de grandes jogadas defensivas e de contra-ataque. Estamos em plena época do Mundial de Futebol, e por isso a comparação é pertinente.

O presidente tem feito más escolhas. Isso deve-se, sobretudo, à sua falta de visão e de uma estratégia para o país que lhe permita colocar as pessoas certas nos lugares certos. Por exemplo: alguém que quer fazer da economia a sua marca de poder, mas mantém como ministro de Estado para a Coordenação Económica o inepto e apagado Manuel Nunes Júnior, só pode estar a encolher os ombros face à realidade.

Temos, então, uma presidência da República com uma assessoria económica flutuante e com um ministro de Estado para a Coordenação Económica que vale como apagão.

Em oito meses, o presidente já vai na nomeação do seu terceiro assessor para os assuntos económicos. É fundamental avaliar a extraordinária rotação, em tão curto intervalo de tempo, naquele que deveria ser o mais importante dos assessores presidenciais. Porquê? Porque João Lourenço prometeu ao país um milagre económico, e afirmou desejar ser o Deng Xiaoping de Angola, emulando o líder chinês que revolucionou a economia do seu país entre as décadas de 1980 e 1990.

O primeiro assessor, Carlos Panzo, foi demitido em Outubro, duas semanas depois da nomeação, quando foi tornado público que as autoridades suíças informaram as autoridades angolanas sobre a investigação de branqueamento de capitais que Panzo enfrenta na Suíça. Alegadamente é um dos grandes beneficiários dos pagamentos corruptos da Odebrecht a entidades governamentais, com vista à obtenção de contratos.

Conforme acordo firmado entre a Odebrecht e o Departamento de Justiça dos Estados Unidos da América, a multinacional admitiu ter pago, entre 2006 e 2013, cerca de 50 milhões de dólares a dirigentes angolanos para obtenção de benefícios no valor de 261 milhões de dólares, com os seus contratos em Angola.

Esta nota é importante porque, depois da demissão de Carlos Panzo, nunca mais houve qualquer esclarecimento por parte da PGR sobre o andamento do caso. Ademais, a 30 de Janeiro de 2017, fizemos uma participação ao ministro da Justiça e ao então PGR, João Maria de Sousa, para tratamento judicial dos esquemas de corrupção da Odebrecht, e nada. A resposta foi o silêncio absoluto.

Não basta ao presidente demitir. É fundamental, para que faça valer a sua autoridade e liderança, a responsabilização civil e criminal dos dirigentes que atropelam a lei. Assim deve ser também com Augusto Tomás,.

Vejamos então a nomeação de Ricardo Viegas d’Abreu para ministro dos Transportes, até então assessor de João Lourenço para os assuntos económicos.

Após a demissão de Carlos Panzo, Ricardo Viegas d’Abreu, então presidente do Conselho de Administração do Banco de Poupança e Crédito (do Estado), foi chamado para aconselhar o presidente em matéria de assuntos económicos.

Na sua breve passagem pelo BPC, não se conhecem as medidas que Viegas d’Abreu terá tomado para responsabilizar a anterior direcção, liderada por Paixão Júnior. Nas redes sociais, circulou uma lista detalhada do crédito malparado e dos maiores devedores do BPC, 12 dos quais haviam alegadamente abocanhado mais de quatro mil milhões de dólares.

Num dos seus raros pronunciamentos sobre o caso, Ricardo Viegas d’Abreu deixou a entender que pouco ou nada faria sobre o crédito malparado: “a recuperação do crédito não depende, muitas vezes, nem da vontade e empenho do próprio agente económico, nem da vontade e esforço do banco na perseguição desse objectivo.”

Todavia, chamou de vândalos os funcionários que supostamente vazaram a lista dos devedores para as redes sociais.”Têm que ser exemplarmente punidos e sancionados“, afirmou.

Em 2000, o governo permitiu a publicação, no Jornal de Angola, da lista de devedores da então Caixa Agropecuária (CAP), que incluia ministros, generais e magistrados. Em ambos os casos, os fundos são públicos.

Quem desgraça o país e a maioria dos angolanos merece a presunção da inocência e a protecção do Estado. Quem denuncia os protegidos pelo poder merece castigo.

Enquanto João Lourenço não tiver uma visão abrangente sobre o que quer para Angola – algo que vá para além do vergonhoso manifesto do MPLA –, as suas nomeações continuarão a ser influenciadas pela sua vontade em escolher amigos, controlar o poder e não em governar.

Comentários