A Entrevista de Isabel dos Santos

Frenesim. É esta a palavra que qualifica o comportamento de Isabel dos Santos depois de conhecidas as acusações que Carlos Saturnino, presidente do Conselho de Administração da Sonangol, lhe fez. Comunicados, televisões, Instagram, entrevistas, elle est partout (i.e., ela está em todo o lado).

Hoje debruçamo-nos sobre o monólogo que Isabel dos Santos concedeu ao diário português Jornal de Negócios. É um monólogo e não entrevista, pois não foi possível descortinar nenhum jornalista, apenas um manequim com cabeleira a servir de “ponto” a Isabel dos Santos. A ex-presidente da Sonangol estava, aparentemente, serena, ponderada e conseguiu transmitir a sua mensagem.

A questão é que a mensagem é fraquinha.

Em primeiro lugar, Isabel tenta politizar o ataque de Saturnino, dizendo que antes de tudo é um ataque ao seu pai, o presidente do MPLA José Eduardo dos Santos; e acrescenta que não tem confiança em João Lourenço.

Não vamos dizer que não é assim. De facto, estão demarcados os campos. Temos um confronto João Lourenço vs. José Eduardo dos Santos, através de mandatários: Saturnino vs. Isabel dos Santos.

Mas Isabel não tem de estar surpreendida. A sua fortuna e a sua posição sempre foram políticas, sempre derivaram da posição política do seu pai. A sua nomeação para a Sonangol não foi senão política. Aliás, foi esse o argumento usado pelos seus apoiantes juristas para contestar a possibilidade de sindicância pelos tribunais dessa nomeação. Os actos políticos não são verificáveis em termos judiciais. Assim foi, e assim é agora.

Estamos obviamente perante um caso político. Isto não quer dizer que também não seja criminal. Mas aí é tempo de deixar a Procuradoria-Geral da República investigar e chegar a conclusões públicas. Espera-se que a PGR tenha independência operacional e meios técnicos adequados para desenvolver com rapidez e convicção a investigação mais importante da sua história.

Depois, além de negar todas as acusações de Saturnino, Isabel desenvolve as suas considerações sobre a gestão da Sonangol. E é aí que se vê que ela não percebe nada. O seu discurso é um conjunto de vacuidades tiradas dos manuais de gestão, sem qualquer concretização real. Se Isabel fosse uma aluna de gestão, dir-se-ia que tinha “marrado” bem a matéria, conhecia a terminologia, mas não fazia ideia do que estava a falar. E é isso que assusta. Temos uma PCA sem qualquer sensibilidade para o negócio, que repete uns mantras sem conteúdo. “Gestão robusta”, “IOC”. É evidente que Isabel precisava de consultores para gerir a Sonangol, porque sem eles não saberia o que fazer, nem como…

Aliás, a argumentação de Isabel é frágil: por um lado, afirma que reestruturou a Sonangol, a qual encontrou falida (e fica sempre a pergunta: mas não foi durante a presidência do seu pai que esta falência aconteceu?); por outro lado, quando lhe perguntam pela lentidão dos processos no relacionamento com outras petrolíferas sob da sua liderança, Isabel afirma que esses processos lentos já existiam desde o tempo de Manuel Vicente, e que ela não mudou nada. Afinal, mudou ou não mudou?

É este, no fim de contas, o problema de Isabel dos Santos. É hábil nas palavras, mas fraca e contraditória no conteúdo. Falou-se muito de uma Matter, a consultora das consultoras. Isabel afirmou que nada tem que ver com essa empresa. Mas porque a contratou? É uma empresa sem história, sem funcionários, com sede no Dubai, ligada aparentemente ao seu braço-direito, Mário Leite da Silva, e a uma sua funcionária da YouCall Lda. Não chega dizer que se tratava de uma consultora que coordenava as outras consultoras e que poupava custos evitando sobreposições. Teria sido importante explicar que na administração da Sonangol não havia ninguém com capacidade para coordenar consultoras, e que era necessária uma consultora desconhecida… Tudo isto é bizarro.

Na verdade, o que sobressai desta novela triste da Sonangol é que cada um levou as suas consultoras milionárias para a Sonangol. Manuel Vicente teve as dele, Isabel trocou e levou as dela.

Resultado: quem sofre é a Sonangol, e o resto é conversa, apresentada com mais ou menos sofisticação. Em termos de apresentação, Isabel dos Santos convence. Em termos de conteúdo, sai derrotada.

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