A Necessidade do Pacto de Regime entre a Oposição e João Lourenço

João Lourenço está numa encruzilhada. Uma vez que a sua legitimidade interna junto da elite partidária que dirige o MPLA, com José Eduardo dos Santos à cabeça, é inexistente, o actual presidente de Angola necessitará de afirmar a sua legitimidade externamente, isto é, junto dos militantes e eleitores do MPLA.

JLo sabe perfeitamente disso: precisa do apoio popular, para que possa então pressionar as elites a deixarem-no governar.

Essa dicotomia com que se defronta João Lourenço – a necessidade de afirmação do seu poder e a obrigação de se autolegitimar interna e externamente – deve levar a que a oposição deixe de se apresentar estrategicamente inactiva e o pressione para que haja um Pacto de Regime. O facto de JLo ter convidado o principal líder da oposição é por si só sintomático dessa necessidade.

Daí que, embora dando-lhe o beneficio da dúvida relativamente às medidas que tem vindo a tomar, isto não possa ser a emissão de um cheque em branco sem retorno. Há que pressionar o presidente, e é esse o papel principal da oposição nesta fase histórica para o país, de modo que tudo não redunde no simbolismo dos actos e no seu valor cosmético.

A magnitude errática, e até criminosa, do legado de JES deverá merecer por parte da actual liderança do país, que tem tido o apoio quase esmagador da população e da sociedade castrense, medidas específicas no contexto do Pacto de Regime, as quais devem visar, a curto-médio prazo:

1 – Anular unilateralmente todos os contratos estabelecidos entre o Estado e empresas que tiveram como base o nepotismo, processos não sujeitos a Concurso Público e que beneficiaram da Garantia Soberana do Estado com esses pressupostos.

2 – Impor o retorno ao país do dinheiro exportado ilegalmente.

3 – Impor o não exercício de cargos públicos, durante dez anos, aos indivíduos que tenham lesado o Estado angolano no valor acima de 50 milhões de dólares.

4 – Institucionalizar com urgência a Alta Autoridade de Combate à Corrupção.

5 –Reformular com urgência o papel da Inspecção-Geral do Estado, tornando-a um órgão com poderes efectivos no combate à corrupção.

6 – Convocar, no período razoável de 18 meses, eleições autárquicas, para que haja descentralização efectiva no país, já que a descentralização é também um meio de combate à corrupção.

Sem estas medidas, não vale a pena falarmos de reformas e deixar que João Lourenço comande de forma isolada todo o processo.

A reforma não terá a profundidade que todos nós auguramos para a estabilização do país a longo prazo. Deixar JLo ficar com os louros todos nesta fase é suicidário para a oposição nas eleições autárquicas que se avizinham. É necessário perceber que o MPLA quererá ganhá-las de forma convincente, recorrendo ao trunfo JLo, porque as medidas correccionais, que ainda são só emblemáticas, visam igualmente aquele desiderato. Daí que seja necessário pressioná-lo, para que o eleitor perceba que as mudanças tiveram o contributo substancial da oposição. Sem isso, teremos no médio-longo prazo mais um ditador disfarçado de reformador e pai da nação.

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