Desequilíbrio Eleitoral: Agir Agora

Na farsa destas eleições, é tão gritante a disparidade da atenção dada pela comunicação social angolana às diferentes forças políticas, que se impõe e justifica uma acção vigorosa. Segundo o jornal Expansão do passado dia 28 de Julho, o tempo dedicado pelos principais órgãos de comunicação social a cada um dos partidos políticos é o seguinte:

Televisão Pública de AngolaTPA:
MPLA: 190 min. (61,9%)
UNITA: 41 min. (13,1%)
CASA-CE: 38 min. (12,2%)
PRS: 17 min. (5,4%)
FNLA: 16 min. (4,8%)
APN: 11 min. (3,5%)

TV Zimbo:
MPLA: 184 min. (64,8%)
UNITA: 37 min. (12,8%)
PRS: 28 min. (9,7%)
FNLA: 16 min. (5,5%)
CASA-CE: 12 min. (4,1%)
APN: 11 min. (3,9%)

Rádio Nacional de Angola – RNA:
MPLA: 145 min. (58%)
UNITA: 36 min. (14,4%)
PRS: 28 min. (11,2%)
FNLA: 17 min. (6,8%)
CASA-CE: 13 min. (5,2%)
APN: 11 min. (4,4%)

Não há quaisquer dúvidas: estes números são inconstitucionais e esta prática representa um desrespeito atroz pela norma fundamental angolana.

Prescreve o artigo 44.º da Constituição que o Estado deve assegurar o pluralismo de expressão e assegurar a existência e o funcionamento independente do serviço público de rádio e de televisão. Por sua vez, o artigo 45.º confere direitos de antena aos partidos políticos.

Numa campanha eleitoral, tem de existir igualdade de tratamento em relação às forças políticas em contenda.

Pela sua importância, o tema tem sido tratado na jurisprudência de países com democracias relativamente recentes, como é o caso de Portugal. Aí tem sido consensual considerar-se que a igualdade de tratamento jornalístico das candidaturas é um princípio estruturante face à importância que a informação representa no desenvolvimento de uma sociedade democrática e no papel que os partidos políticos e outras forças políticas desempenham na formação da opinião pública e da vontade popular. Tudo para o correcto e cabal esclarecimento do público e para a formação da vontade popular.

A exigência legal de conceder um tratamento equilibrado às diversas candidaturas dirige-se a todos os órgãos de comunicação social que pretendam divulgar matéria respeitante à campanha, independentemente da sua natureza pública ou privada. Considera-se que no âmbito da cobertura noticiosa da acção das candidaturas vigora a regra básica de que às notícias ou reportagens de factos ou acontecimentos de idêntica importância deve corresponder um relevo jornalístico semelhante, quer ao nível de espaço informativo, quer no que respeita ao aspecto e relevo gráfico.

Assim, não se pode dar maior destaque a determinadas candidaturas em detrimento de outras, com o fundamento, designadamente, da pretensa maior valia de um candidato e a irrelevância político-eleitoral de outro, entre outras regras.

Em Angola, os mesmos princípios estão estabelecidos no ordenamento jurídico.

Além da Constituição, a Lei Orgânica sobre as Eleições Gerais impõe estes deveres de forma clara aos órgãos de comunicação social, decretando que, sejam públicos ou privados, devem agir com rigor, profissionalismo e isenção relativamente às campanhas eleitorais (artigo 65.º, n.º 2) e ao prescrever que os mesmos órgãos são responsabilizáveis pelo incumprimento destas regras (artigo 65.º, n.º 3).

Por consequência, quer face à Constituição, quer face à Lei, o comportamento que os órgãos de comunicação social estão a revelar nestas eleições é ilícito.

Compete à Comissão Nacional Eleitoral assegurar que a igualdade de oportunidade e tratamento das diversas candidaturas é respeitada. Em rigor, a publicação destas estatísticas devia levar a CNE a agir por vontade própria – caso isto não aconteça, deveriam os partidos prejudicados, desde já e com carácter de urgência, apresentar queixa à CNE, sendo que esta tem o dever de decidir e tomar medidas para evitar o constante desequilíbrio na cobertura mediática da campanha eleitoral.

Caso a CNE não o faça, ou não o faça de forma adequada, os partidos deveriam recorrer ao Tribunal Constitucional, que tem a jurisdição sobre as questões de natureza eleitoral (artigo 180.º, n.º 2, c) da CRA).

Acresce que, de acordo com a actual Lei de Imprensa, conjugada com a norma responsabilizadora da Lei das Eleições Gerais, os órgãos de imprensa que actuem de forma desequilibrada podem incorrer no pagamento de pesadas indemnizações monetárias.

Em suma, o desequilíbrio noticioso a que se assiste é ilícito, sendo que perturba e inviabiliza o decurso de um escrutínio livre e justo.

O primeiro passo para reagir a este atropelo claro do direito eleitoral é recorrer à CNE e exigir que esta tome medidas para reinstaurar o tratamento igualitário. Caso a CNE se recuse a tomar medidas, deve-se prosseguir para o Tribunal Constitucional.

Entretanto, as empresas de comunicação social podem ser desde já alvo de pedidos de elevadas indemnizações, pelo prejuízo que estão a causar ao desenrolar do processo eleitoral.

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