Governo Retalia: Mais um Concerto de MCK Proibido

O Governo da Huíla proibiu hoje a realização de um espectáculo musical dos rappers MCK, Kool Klever e DJ Pelé, programado para sábado, na cidade do Lubango.

Depois de os promotores do espectáculo terem cumprido os trâmites exigidos por lei, o Departamento de Artes e Acção Cultural da Direcção Provincial da Cultura do Governo Provincial autorizou a realização do evento, inicialmente previsto para o dia 29 de Outubro. A 23 de Setembro, o referido departamento emitiu a guia de autorização de espectáculo nº 57/2016, para a realização do evento no Pavilhão do Benfica. Esse documento foi assinado por Pedro Mussunda, chefe do referido departamento.

Jerónimo Pedro, o promotor do espectáculo, refere que este teve de ser adiado por razões logísticas, mas “recebi garantias da polícia quanto à segurança, e da cultura, que me informou de que a mesma autorização valeria para a nova data”.

“Ontem, o senhor Pedro Mussunda telefonou-me de urgência a informar que o espectáculo carecia de nova autorização e disse que me ajudaria a resolver o assunto, bastando formular um novo pedido e ele emitiria a nova licença”, refere o promotor.

“Afinal, era um ardil. Usou a carta que me pediu para proibir o espectáculo com base no decreto presidencial 111/11”, explica Jerónimo Pedro.

Segundo o promotor, o mesmo Pedro Mussunda “ligou para a província do Namibe, a pedir também que as autoridades locais cancelassem o show do dia 20 de Novembro”. Os organizadores locais queixam-se também de terem recebido a visita de elementos alegadamente afectos ao Serviço de Inteligência e Segurança de Estado (SINSE), que foram transmitir verbalmente a proibição do evento. “Depois de terem verificado os documentos, os homens do SINSE disseram que estariam presentes no espectáculo e que terminariam com o mesmo, caso notassem desvios relevantes”, ressalta Jerónimo Pedro.

O Maka Angola tentou estabelecer contacto telefónico com Pedro Mussunda, mas este não respondeu nem retornou as chamadas.

A Direcção Provincial, através do despacho 57/DPCH/2016, alega ter recebido apenas o pedido de realização do espectáculo a 18 de Novembro, hoje, data em que respondeu negando o pedido.

Entretanto, o rapper MCK entende que a proibição de hoje é uma retaliação pelo facto de ter aparecido com uma postura crítica no documentário do canal televisivo português SIC, exibido ontem, o qual irritou profundamente o regime. No documentário, MCK circula pelo musseque do Margoso mostrando a extrema miséria em que vivem milhares de angolanos a pouco mais de um quilómetro a sul do Palácio de José Eduardo dos Santos. No mesmo documentário, o artista recorda o caso do lavador de carros Arsénio Sebastião “Cherokee”, de 27 anos, brutalmente assassinado por soldados da Unidade da Guarda Presidencial (UGP) em 2003. O jovem cantarolava a música de MCK “A Téknika, as Kausas e as Konsekuências” ou “Sei Lá o Quê, Uáué”, enquanto lava carros no embarcadouro do Mussulo, quando os guardas o ouviram. Pediram-no para cantar novamente, arrastaram-no para a água e afogaram-no na presença de inúmeros banhistas.

A 5 de Novembro, agentes da Polícia Nacional impediram a realização de um espectáculo de MCK e Luaty Beirão, no Cinema Tivoli, em Luanda, retirando compulsivamente a licença de exploração da sala. 

MCK nota que tanto num caso como no outro apenas se perseguem os “rappers críticos, essas medidas não se aplicam aos cantores colados ao regime”.

O decreto presidencial nº 111/11, que tem sido evocado para impedir vários espectáculos e que regula a actividade de espectáculos e divertimentos públicos, foi exarado na consequência de um espectáculo de MCK e Luaty Beirão, no Cine Atlântico. Durante o show, Luaty Beirão usou o palco para enviar um recado ao presidente José Eduardo dos Santos, através do seu filho Danilo, que se encontrava na plateia. Luaty criticou então em público a longevidade do presidente no poder. Era o ano efervescente da Primavera Árabe e das múltiplas tentativas de manifestação em Luanda, que exigiam a demissão do presidente.

O analista legal do Maka Angola, Rui Verde, denuncia o “cunho fascista” do decreto presidencial nº 111/11.

“Vamos à Constituição. O artigo 43.º, sobre liberdade de criação cultural, no seu n.º 2, garante a divulgação da obra artística. Este direito fundamental está protegido pelo artigo 28.º, pelo que se aplica directamente e vincula toda a gente, entidades públicas e privadas, e sobrepõe-se a qualquer decreto presidencial”, refere o analista.

A seu ver, não podem existir decretos presidenciais que limitem a divulgação de trabalhos artísticos, como são os espectáculos de MCK ,ou que na prática os invalidem. “Portanto, a utilização do artigo 22.º, nº 5 do decreto n.º 111/11 para impedir a realização de um espectáculo já autorizado de divulgação de obra artística é abusivo e inconstitucional”, diz.

E conclui, sem hesitar; “A proibição não respeita a Constituição, porque viola os artigos 28.º e 43.º. Por, isso não pode obrigar ninguém.”

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