Sonangol: Os Elefantes Também Conseguem Dançar?

Os defensores da inefável nomeação de Isabel dos Santos para a Sonangol (para além da própria) esgrimem argumentos jurídicos mas também estratégicos e gestionários.

Os argumentos estratégicos podem ser resumidos em duas vertentes. Por um lado, a nomeação é uma resposta à actuação de Portugal no BPI e pretende defender os interesses gerais de Angola; por outro lado, evita a corrupção para que tenderiam outros agentes nomeados – ao escolher a filha, em quem deposita inteira confiança pessoal, o presidente deposita evita criar mais novos-milionários à custa do erário público.

A relação desta nomeação com Portugal é de difícil discernimento. Mesmo que se quisesse entregar a Isabel dos Santos a participação da Sonangol no BCP português, não era necessário nomeá-la presidente da companhia. Bastava cindir essa ou outras participações. Em termos estratégicos, a nomeação protege os interesses de Isabel e não os de Angola. Na realidade, sabemos que os seus vários investimentos privados estavam a ser alvo de escrutínio por parte das autoridades europeias e eventualmente norte-americanas, devido à possível e alegada promiscuidade com fundos públicos, corrupção, branqueamento de capitais, etc. Ora, a forma mais fácil de baixar uma cortina sobre essas investigações é colocar Isabel dos Santos na Sonangol, que foi sua financiadora, pelo menos para a compra da GALP e da NOS (via UNITEL), e lhe vendeu a participação no BPI. Tornando-se mutuária e mutuante, compradora e vendedora, credora e devedora, tudo fica mais complicado, além de se chocar de frente com uma empresa petrolífera politicamente forte que está no radar de todos os Fundos, de Boston à Florida. Portanto, interesse estratégico haveria para a protecção dos interesses isabelinos, não angolanos.

O segundo argumento – que se trata de uma escolha de confiança do pai, para evitar continuar a ser roubado – faria sentido se estivéssemos a assistir, finalmente, à tomada de medidas para acabar com as negociatas ao nível da família presidencial. Mas não é isso que se reporta quotidianamente. Ainda a 8 de Junho passado, Rafael Marques anunciava e denunciava outro negócio, agora com o prédio Imob Business Tower, construído por 40 milhões e comprado pelo Ministério das Finanças a Zenú e amigos pelo triplo do valor, 115 milhões…

Só quando nos confrontarmos com um verdadeiro movimento de combate ao sistema corrupto de Angola – a começar pela cabeça do mesmo – poderá este argumento ganhar credibilidade.

Há ainda um terceiro argumento adicional: o dos conhecimentos e da capacidade específica de Isabel dos Santos. A própria Isabel mencionou que “não foi por causa de questões políticas [que foi nomeada]. Fui escolhida para este projecto por causa da minha experiência no sector privado”.

Não discutimos a competência e a experiência de Isabel dos Santos no sector privado. Aceitamos a sua inteligência, capacidade e conhecimento.

O que discutimos é o que ela, enquanto gestora, pode fazer pela Sonangol. É nesta altura que faz sentido invocar o livro Who Says Elephants Can't Dance? (“Quem disse que os elefantes não conseguem dançar?”), em que o autor, Lou Gerstner, escreve sobre o modo como geriu e salvou a grande companhia norte-americana IBM. Essa gestão de grandes companhias, como é a Sonagol, implicam sempre medidas radicais, como despedimentos, vendas de activos, reestruturações de funções e cargos, tudo devendo ser realizado com rapidez, simplificação e dedicação exclusiva.

Poderemos conceber que Isabel dos Santos tenha (até por ser filha do presidente) a possibilidade de despedir gente, simplificar procedimentos, implantar uma verdadeira reforma da companhia, entre dois voos e reuniões das suas outras companhias? É óbvio que não. Qualquer venda que Isabel faça ficará automaticamente sob suspeita. Qualquer despedimento será um passivo para o pai e o MPLA. Portanto, a margem de manobra é muito estreita. Mas também é óbvio que não serão os consultores chiques a tomar as decisões, porque não sabem fazê-lo.

Qualquer reestruturação de uma companhia desta dimensão dedicação exclusiva, nervos de aço, e permanente atenção. Dirão que Isabel dos Santos não se vai dedicar a nada disto, uma vez que não é executiva. Então, a pergunta coloca-se de outra maneira: irá algum executivo tomar decisões estratégicas radicais sem o consentimento de Isabel? Não. Em termos de gestão, esta nomeação serve meramente para atrapalhar e confundir, uma vez que não vai haver uma liderança sólida, clara e determinada.

Qualquer turnaround de empresa necessita de liderança forte, clara, permanente e disponível. Precisa de pessoas como Lou Gerstner (IBM), Jack Welch (GM), ou Horta Osório (Lloyds), e não resulta da intervenção de consultoras.   E Isabel dos Santos claramente, em termos objectivos, não tem o suficiente para dar à Sonangol.

Resumindo, para além de constituir uma ilegalidade, como já se referiu noutros textos, a nomeação de Isabel dos Santos não tem qualquer fundamento estratégico ou gestionário.

 

 

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