Mana Isabel, Mana Unitel e a Violação da Lei da Probidade

Para que serve a Lei da Probidade em Angola?

Regra geral, os cidadãos interessados no modo de gestão dos recursos do Estado consideram a Lei da Probidade como sendo apenas um formalismo jurídico-político, sem qualquer aplicação prática.

As recentes revelações públicas sobre o empréstimo total de US $256.1 milhões que a empresa de telefonia móvel Unitel S.A. concedeu a Isabel dos Santos, sua accionista e filha do presidente da República, suscitam, mais uma vez, dúvidas sobre a utilidade da referida lei e demais legislação em vigor.

Enquanto empresa participada pelo Estado, através da Sonangol, os gestores e responsáveis da Unitel sujeitam-se também à Lei da Probidade. De acordo com a lei (Art. 15.º, 1.º, I), são considerados agentes públicos os gestores, os responsáveis e os funcionários das empresas participadas pelo Estado.

Isabel dos Santos é administradora da Unitel.

A referida administradora usou o empréstimo para proveito próprio, servindo-se do cargo que ocupa e do poder do seu pai. Esse acto, causador de grande prejuízo para os interesses do Estado, é discriminado pela Lei da Probidade como tratando-se de um mecanismo de enriquecimento ilícito (Art. 25.º, 1.º, a) e k).

Por outro lado, um especialista em assuntos financeiros, que preferiu manter o anonimato, nota que “do ponto de vista legal, as empresas não podem conceder crédito. O crédito só pode ser concedido por instituições financeiras autorizadas”.

De acordo com o especialista, as empresas podem conceder empréstimos às suas participadas. “Mas, nesse caso, chamam-se suprimentos.”

“Se [a empresa beneficiária] não é participada e, ainda por cima, estrangeira, para investimento fora do país, não faz sentido.”

O Contexto

Coube à Portugal Telecom (PT), sócia da Unitel S.A. com uma quota de 25 por cento, revelar às entidades reguladoras portuguesa, a Comissão do Mercado e Valores Mobiliários (CMVM), e estadounidense, Securities and Exchange Commission(SEC) informações sobre o empréstimo, num relatório recente.

Segundo a PT, os empréstimos foram concedidos em duas fases, entre Maio e Outubro de 2012, à Unitel International B.V., registada no paraíso fiscal da Holanda.

O que é a Unitel International B.V.?

A Unitel Internacional B.V. resulta da alteração do nome da Jadeium B.V., empresa constituída a 4 de Maio de 2012, na Holanda, por Isabel dos Santos. Passado um mês, a 12 de Junho de 2012, a Jadeium adquiriu directamente, à Caixa Geral de Depósitos , um total de 10.96 por cento das acções que esta detinha na Zon Multimédia.

No seu relatório, a PT refere que se opôs ao empréstimo. Pela primeira vez, a empresa de telecomunicações portuguesa indica que, desde 2006, tem sido impedida de exercer dois dos três lugares que lhe cabem, por acordo da sociedade, no conselho de administração da Unitel. Sem os três votos, a PT tornou-se incapaz de exercer o seu direito de veto no conselho de cinco membros. Desde 2006, os outros accionistas, incluindo a Sonangol, também impedem a nomeação do director executivo da Unitel pela PT, conforme o estatuído no acordo entre accionistas.

No ano passado, de acordo com informações da PT, a Unitel gerou receitas no valor de US$2.2 biliões (mil milhões) e lucros na ordem dos US$964.5 milhões.

Unitel Angola ou Unitel Holanda?

Por sua vez, a empresa holandesa Unitel International Holdings B.V., adoptou também o logotipo da Unitel S.A., e tem estado a investir no exterior do país como se fosse a Unitel Angola a fazê-lo. A empresa holandesa de Isabel dos Santos tornou-se a mais recente operadora de telefonia móvel em Cabo Verde, através da Unitel TMais  e, no ano passado, ganhou a segunda licença de exploração em São Tomé

Em resposta às questões levantadas pela PT, a assessoria de imprensa de Isabel dos Santos apresentou à comunicação social portuguesa a sua versão. Segundo a fonte, citada pela RTP, os movimentos financeiros em disputa devem-se à reestruturação da gestão e à reorganização da Unitel, em função do seu rápido crescimento e da “sua ambição internacional”.

“Ora, a Unitel possui a sua própria visão de se internacionalizar, tendo já executado com êxito duas operações noutros mercados e estando a analisar a aquisição de outras cinco operadoras móveis”, afirmou a fonte.

As duas operações bem-sucedidas são a entrada nos mercados de telecomunicações de Cabo Verde e São Tomé e Príncipe pela Unitel International Holdings B.V., a empresa holandesa sem qualquer ligação institucional à Unitel Angola.

É absolutamente notória a intenção de confundir e enganar o público sobre a existência das duas Unitel, a angolana e a holandesa, como sendo uma e a mesma empresa. Na realidade, a única ligação entre ambas é o facto de Isabel dos Santos ser accionista da Unitel S.A. (Angola), na qual o Estado e a Portugal Telecom também são accionistas, e proprietária da Unitel International Holdings B.V., sem a participação dos outros sócios.

O uso da marca corporativa Unitel por parte da empresa holandesa de Isabel dos Santos, como se uma fosse subsidiária da outra, revela a extensão da falta de ética e deslealdade empresarial da filha do presidente.

Enquanto agente pública, Isabel dos Santos carece de consciência e postura de bem servir. Segundo a Lei da Probidade, esses pressupostos “devem constituir uma referência obrigatória na actividade do agente público, quer perante os cidadãos quer perante entidades públicas ou privadas”.

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