Vice-Presidente de Angola é Director na China-Sonangol

Manuel Vicente, o vice-presidente da República, continua a acumular funções de Estado com cargos privados no exterior do país.

Documentos em posse de Maka Angola revelam que Manuel Vicente renovou a sua manutenção no cargo de director da empresa China Sonangol International Holding, baseada em Hong-Kong, a 6 de Setembro de 2012.

Contas feitas, Manuel Vicente submeteu a sua confirmação, como director da empresa, seis dias após ter sido eleito vice-presidente da República. Nessa altura, Manuel Vicente exercia já um cargo governativo, como ministro de Estado para a Coordernação Económica, para o qual fora nomeado, por decreto presidencial, em Janeiro de 2012.

A China Sonangol Internacional Holding (CSIH), criada em 2004, é uma empresa detida em 70 porcento pela Dayuan International Development Limited, cabendo à empresa angolana de petróleos Sonangol, a participação minoritária de 30 porcento.

Por sua vez, a Dayuan tem como sócios nominais a New Bright International (NBI), que detém 70 porcento, e pelo cidadão chinês Wu Yang (30 porcento). Investigações internacionais têm ligado Wu Yang aos serviços de inteligência da China. O relatório O Grupo 88 Queensway notou que Wu Yang usou o endereço oficial dos serviços de espionagem externa da China na constituição de empresas associadas a Sonangol. A revista The Economist revelou, em 2011, que Wu Yang foi afastado da empresa e

intentou uma acção judicial contra os outros sócios fundadores. A NBI é detida pelos cidadãos chineses Veronica Yuen Kwan Fung (70 porcento) e Lo Fong Hung (30 porcento).

Todavia, apesar das formalidades legais publicamente conhecidas não o indicarem, como tal, o verdadeiro arquitecto e patrão da China Sonangol é o antigo traficante de armas chinês Sam Pa.

O que é a China Sonangol e porquê Manuel Vicente insiste em manter-se como seu director? As respostas a essas duas perguntas conduzem o leitor para uma teia de interesses obscuros, que usam o nome da Sonangol como cartão de crédito, acesso e credibilidade a nível internacional. É por essa via que o Presidente José Eduardo dos Santos, Manuel Vicente e o general Kopelipa transformaram o processo de reconstrução nacional num negócio da China. Este triunvirato tem garantido o carregamento anual de nada menos que metade do petróleo angolano para esse país e tem disponibilizado a guarda presidencial para receber, no aeroporto de Luanda, os mais de 258 mil chineses, enviados para Angola para implementar os projectos de reconstrução.

A China Sonangol

Em 2009, uma comissão do Congresso dos Estados Unidos, dedicada ao estudo sobre as relações económicas e de segurança entre os E.U.A. e a China, publicou um relatório sobre as operações de investidores chineses em Angola, intitulado O Grupo 88 Queensway.

Esse relatório detalha como em 2004, um consórcio estabelecido entre a Beya (ora Dayuan), a Escom do Banco Espírito Santo, e a Sonangol criaram a Sonangol Asia Limited, registada em Hong-Kong, cabendo à Sonangol 40 porcento da sociedade. A investigação notou que os propósitos dessa empresa não eram claros, não tinha projectos específicos em Angola, mas o seu nome e existência confundia-se com o da Sonangol Asia, uma subsidiária detida a 100 porcento pela Sonangol e baseada em Singapura. Ou seja, há duas empresas com o nome de Sonangol Asia, uma operada pelos chineses e a outra que supervisiona as operações da Sonangol angolana na Ásia.

Os contactos e negociatas com Manuel Vicente levaram a Dayuan a criar mais de uma dezena de empresas, usando o nome e a marca da Sonangol, e a dominar tanto o poder político em Angola, assim como a sua economia política. Para o efeito, o principal artífice dessa aproximação foi Pierre Falcone, o mercador de armas e um dos mais bem sucedidos corruptores da liderança do país. A Piersons Capital, de Pierre Falcone, passou a encaixar cinco porcento dos valores dos negócios entre a China e a Sonangol, sob o manto da reconstrução nacional, na sua qualidade de intermediário.

Em finais de 2003, a Dayuan, na altura conhecida como Beya, criou a empresa China International Fund Limited (CIF) que passou a gerir as linhas de crédito e os projectos de reconstrução sob a alçada do então Gabinete de Reconstrução Nacional, chefiado pelo general Kopelipa.

Desde então, a China Sonangol International Holdings Limited (CSIH) passou a deter acções em nove blocos de petróleo em Angola e tornou-se numa das empresas com mais activos no sector e das mais influentes. Como ilustração, no Bloco 18 de águas ultra-profundas, a CSHI, através da Sonangol Sinopec Internacional (SSI), tem 50 porcento das acções. O Bloco 18 é operado pela British Petroleum. Em 2010, a empresa estatal Chinesa Sinopec pagou US $2.46 mil milhões por 55 porcento das acções na SSI. Por sua vez, a SSI também tem participação no Bloco 31 de águas ultra-profundas (5 porcento), também operado pela British Petroleum. A Sinopec, empresa estatal chinesa, anunciou, a 24 de Junho, aquisição de mais 10 porcento no Bloco 31, por US $1.52 bilião. Na realidade, a compra é efectuada Sonangol Sinopec Internacional. O bloco tem reservas estimadas em 533 milhões de barris de petróleo.

No Bloco 32 de águas ultra-profundas, operado pela Cobalt, a China Sonangol Internacional Holding (CSHI) mantém uma participação de 20 porcento. Na exploração de pré-sal, a CSHI tem 15 porcento no Bloco 38, operado pela Statoil, segundo informações divulgadas pelas autoridades angolanas.

Em 2011, a China Sonangol adquiriu uma participação de 10 porcento, no Bloco 20, operado pela Cobalt, em águas profundas.

Em Fevereiro passado, o executivo do presidente José Eduardo dos Santos autorizou a CSHI a proceder a venda dos 10 porcento da participação, que detinha no Bloco 19/11, à Companhia Espanhola de Petróleos.

Para além das participações nos blocos, a CSIH também estabeleceu um lucrativo contrato de aquisição de grande parte do petróleo angolano.

O The Economist expôs o modo como a CSIH adquire o crude a um preço de base, determinado em 2005, e revende-o à China ao preço actual de mercado. Em 2005, segundo o semanário britânico, o preço do barril de petróleo situava-se abaixo de US $55, e em 2011, acima de US $100. Os lucros deste esquema de corrupção estão avaliados em dezenas de biliões de dólares, ao longo de quase uma década. As perdas, para Angola, são incalculáveis.

Os negócios da CSHI estendem-se também ao sector dos diamantes com a aquisição, em 2011, de 18 porcento da mina de Catoca, o quarto maior kimberlito do mundo, localizado na Lunda-Sul. A CSHI pagou US $400 milhões a Lev Leviev pelas acções, que as havia comprado por US $20 milhões nos anos 90. O mesmo Leviev vendeu à CSHI o edifício da J.P. Morgan na Wall Street, em Nova Iorque, por US $150 milhões. Lev Leviev detém 11.89 porcento das acções da China Sonangol Resources Enterprise, uma subsidiária da CSHI, registada nas Bermudas e envolvida na mineração de carvão na China.

No domínio da aviação, a Sonangol privada dos chineses usa a mesma imagem de marca da Sonair, na empresa que opera os seus 10 Airbus 319 e 320, que voam pelo mundo.

Os negócios da CSHI tem estado a crescer em várias partes do mundo e nos mais variados domínios económicos, movimentando anualmente vários biliões de dólares.

No seu relatório e contas de 2012, a empresa pública Sonangol lista as percentagens que detém nas suas subsidiárias e associadas. Em nenhuma das categorias consta a sua participação especifíca na CSHI e os lucros correspondentes. Segundo explicações de um economista, sob anonimato, a Sonangol não precisa de consolidar, no seu relatório e contas, a sua participação na CSHI, por não ter uma posição de controlo. No entanto, é obrigada a contabilizar os dividendos provenientes da CSHI. “Mas, se a China Sonangol não distribuir dividendos, não aparece, de facto nas contas da Sonangol E.P.”, diz o economista. Ou seja, os relatórios da Sonangol não demonstram quaisquer lucros provenientes da CSHI. Então, para que serve a participação da Sonangol e os seus massivos investimentos na CSHI, se não obtém benefícios?

Manuel Vicente responderá.

Outro economista nota que a Sonangol não publica contas consolidadas. “Prometeu fazê-lo em breve e colocá-las na página da net”, disse. Por outro lado, o economista indica que no relatório e contas da Sonangol consta apenas “activos não correntes, provavelmente empréstimos, relacionados com a CSHI no valor de 48 mil milhões de kwanzas ou 500 milhões de dólares”.

Constituição de Papel

Sobre a acumulação de funções exercida por Manuel Vicente, a Procuradoria-Geral da República (PGR) estabeleceu um precedente, no seu despacho de arquivamento do Inquérito Preliminar n° 06-A/2012, em Janeiro passado. A PGR reconheceu, como crime, o exercício acumulado de cargos em órgãos de soberania com funções de direcção em empresas comerciais, no referido despacho.

A investigação resultou de uma denúncia do autor, em Janeiro de 2012, sobre o envolvimento de Manuel Vicente e os generais Manuel Hélder Vieira Dias “Kopelipa” e Leopoldino Fragoso do Nascimento numa série de negociatas com o Estado angolano e entidades estrangeiras, para enriquecimento pessoal.

O despacho, assinado pelo Procurador-Geral adjunto Domingos Salvador André Baxe, certificou que o general Kopelipa, ministro de Estado e chefe da Casa de Segurança do Presidente da República exerceu cumulativamente com o cargo de administrador da sociedade Portuguesa World Wide Capital, S.A. até à entrada em vigor da nova Constituição.

É com base no argumento da entrada em vigor da nova Constituição que o Ministério Público exonerou o general Kopelipa de quaisquer actos de improbidade resultante da acumulação de funções.

Como irá a Procuradoria-Geral da República justificar a ganância de Manuel Vicente, que renovou a acumulação de cargos, públicos e privados, dois anos após ter sido aprovada a nova Constituição e seis dias depois de ter sido eleito vice-presidente?

Será necessário apresentar nova denúncia junto do gabinete do Procurador-Geral, o general João Maria Moreira de Sousa?

O presidente José Eduardo dos Santos, que quer ser lembrado como bom patriota, fechará os olhos, mais uma vez, a este atentado contra a soberania nacional? Ou é cúmplice ou mandante?

Há muito mais perguntas para endereçar aos patriotas do MPLA, que se acham com o poder exclusivo sobre Angola e o destino dos angolanos e sancionam o saque do país.

O uso abusivo da marca Sonangol, pertença do povo angolano, pelos chineses e a pilhagem consequente dos recursos nacionais é um acto de patriotismo de Manuel Vicente?

Por certo, a constituição da China Sonangol não é senão o estabelecimento de um dos maiores sindicatos de crime organizado de que a África independente tem memória, para a rapina dos recursos naturais e financeiros de um país.

O patriota José Eduardo dos Santos será lembrado como o líder que, com maior sucesso, implementou a corrupção como sistema de governo e vendeu o seu país para enriquecimento de uma mão cheia de patriotas do seu séquito.

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