MPLA: a Campanha do Vale-Tudo

A campanha eleitoral conheceu um novo método de aliciamento de votos a 15 de Agosto, em Saurimo, província da Lunda-Sul. O candidato a deputado do MPLA, Bento Kangamba, convidou centenas de jovens locais, a quem distribuiu directamente, e a cada um, a quantia de 200 a 500 dólares.

“Eu recebi 500 dólares das mãos do Bento Kangamba. Ele obrigava as pessoas a vestirem as camisolas do MPLA antes de receberem o dinheiro”, revelou António Queque, de 30 anos, um dos jovens que acorreu, no dia 15, ao Clube 17 de Setembro.

“Vesti a camisola do MPLA, recebi o dinheiro, ouvi o que o Bento Kangamba tinha a dizer. No encontro, ele apresentou também um senhor de nome Kopelipa, que veio de Luanda, mas este não falou”, informou António Queque.

Por sua vez, João Cauica, de 37 anos, dirigiu-se ao Hotel Kawisso, onde o referido político, acompanhado pelo ministro de Estado e chefe da Casa Militar do Presidente da República, general Manuel Hélder Vieira Dias “Kopelipa”, procedeu também à distribuição de dinheiro a mais de cem jovens.

“Eu recebi US $200 das mãos do Bento Kangamba e a nossa tarefa era a de atrairmos mais jovens para receberem também e votarem no MPLA”, disse João Cauica.

“Com a ambição do dinheiro, a juventude acorreu em massa. Havia filas bem organizadas. A mensagem que ele passou era para abandonarmos o PRS (Partido de Renovação Social) porque o MPLA é o único partido com dinheiro, e toda a riqueza para desenvolver Angola está nas mãos do MPLA”, explicou João Cauica.

O cidadão afirmou ainda que “claramente o MPLA veio a Saurimo apresentar o seu verdadeiro manifesto político, o da corrupção. Nós recebemos o dinheiro mas achamos que a democracia não é a corrupção. Queremos outra forma de governação”, enfatizou.

Tanto António Queque como João Cauica assumiram a sua militância no PRS.

A acção de Bento Kangamba fez parte dos preparativos da visita do candidato do MPLA e presidente da República, José Eduardo dos Santos, a principal figura de cartaz do showmício realizado ontem, 16 de Agosto, no Estádio das Mangueiras.

Para além do discurso político do candidato, perante uma audiência de cerca de sete mil pessoas, que lotaram o pequeno estádio, o público teve a oportunidade de assistir a um concerto com Afroman, Yola Araújo, Matias Damásio, Big Nelo, Nagrelha, entre outros.

Como forma de se ultrapassar a pouca afluência da população local à campanha, a organização disponibilizou vários autocarros para o transporte de pessoas dos municípios da província da Lunda-Sul para a capital.

O clima militarizado que se viveu na cidade, para garantia de segurança do presidente, segundo vários testemunhos, obrigou a que muitos cidadãos se recolhessem nas suas residências. Do aeroporto à cidade, numa distância de sete quilómetros, a segurança presidencial desdobrou vários tanques BMP-1 e BMP-2, enquanto elementos da guarda presidencial se multiplicaram pela cidade, armados com lança-granadas castores, RPG-7s, metralhadoras RPK e PKM.

Durante o comício, José Eduardo dos Santos garantiu à audiência que “o MPLA é o partido da verdade, ama o povo angolano e luta pelo seu bem-estar e é por isso que tem o apoio do povo”. Dos Santos mostrou-se confiante na decisão do povo angolano em conceder a vitória ao MPLA.

Clima de Terror no Léua

Na província do Moxico, a segunda etapa da campanha eleitoral do presidente José Eduardo dos Santos pelas províncias, as autoridades locais decretaram o dia de hoje como de tolerância de ponto. Todas as instituições públicas e privadas foram encerradas para acolher a visita do candidato do MPLA.

No Luena, o candidato do MPLA reinaugurou, na sua qualidade de presidente da República, a circulação de comboio no troço entre as cidades do Luena-Kuito, ligando as províncias do Moxico e do Bié por via ferroviária.

Na sua alocução sobre o projecto, Dos Santos afirmou que “vão viajar pessoas de todos os extractos sociais, todas as regiões, e vai ser realmente o comboio que vai resolver os problemas dos angolanos”.

Os dirigentes do MPLA baptizaram a locomotiva de “comboio da vitória” e “comboio da reconciliação e do perdão”, como memorial do período de guerra, da vitória e do esforço de reconstrução do MPLA.

Mas, no município do Léua, no Moxico, o discurso é diferente e marcadamente antagónico.

Segundo João Tchipuissa, residente na sede do município, as Forças Armadas Angolanas (FAA), pela primeira vez desde o fim da guerra, em 2002, enviaram um destacamento militar considerável à região, há duas semanas.

“Na única comuna do município, no Liangongo, o 2.º secretário do MPLA, Raimundo Muanacalunga, tem estado a fazer uma campanha aberta, dizendo às pessoas que, se não votarem no MPLA, as tropas já estão aí estacionadas para fazerem a guerra”, afirmou João Tchipuissa.

O interlocutor manifestou ainda a agitação da população face às ameaças de guerra, que passaram também a ser difundidas por outros membros do MPLA na localidade. “Nós estamos a perguntar se a democracia é mesmo o direito de a pessoa escolher ou simplesmente a obrigação de votar em quem tem a força. A população está muito confusa no Léua e com muito medo”, referiu João Tchipuissa.

Por dificuldades de comunicação, não foi possível obter o contacto e a reacção da estrutura local do MPLA no Léua.

O município do Léua tem cerca de 14 mil eleitores, muitos dos quais tiveram os seus nomes transferidos para outros municípios ou assembleias de voto a 40 ou 50 quilómetros de distância dos locais onde se inscreveram para votar, o que fará, eventualmente, com que desistam de participar no acto eleitoral.

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