IURD: Milhões de Dólares Desviados para o Brasil

A 12 de Janeiro, o Tribunal da Comarca de Luanda retomou o julgamento de bispos e pastores da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) acusados de crimes de associação criminosa e branqueamento de capitais. O julgamento teve início a 18 de Novembro com a igreja dividida em duas alas, a angolana e a brasileira.

Em Junho de 2020, um grupo de pastores angolanos rebelou-se contra a liderança brasileira da IURD em Angola. No acto, tomou 35 templos da instituição em Luanda e cerca de 50 no resto do país. O conflito levou a acusações de racismo por parte dos angolanos, e de xenofobia por parte dos brasileiros. Até o presidente brasileiro Jair Bolsonaro tentou intervir.

Em carta endereçada ao presidente angolano, Bolsonaro exprimiu preocupação “com a invasões a templos e outras instalações da Igreja Universal do Reino de Deus” e pediu que, “sem prejuízo pelos judiciais, com o seu tempo próprio, se aumente a protecção dos membros da IURD, a fim de garantir a sua integridade física e material e a restituição de propriedades e moradias, enquanto prosseguem as deliberações nas instâncias pertinentes”.

A pressão diplomática fracassou. A Procuradoria-Geral da República (PGR) desencadeou uma operação de encerramento dos templos da IURD em Luanda, como parte de uma investigação criminal.

Mas, a principal causa da cisão, segundo relevaram ao Maka Angola cinco bispos e pastores angolanos, assim como outros membros da igreja, era o dinheiro. Pilhas e pilhas de dinheiro vivo.

“Durante a construção do Templo de Salomão [réplica do templo homónimo da Bíblia e sede mundial da IURD, em São Paulo], levámos muito dinheiro para o Brasil para pagamento das obras. Angola pagou, e muito!”, denuncia o pastor Inácio Jimi, hoje porta-voz da Comissão Reformista da IURD, formada pelos pastores angolanos que se rebelaram contra a autoridade dos bispos brasileiros.

O “Templo de Salomão” da IURD, construído na cidade de São Paulo com o dinheiro de fiéis de todo o mundo.

Para explicar com clareza a situação, Inácio Jimi conta que fez parte do grupo de cem pastores, mais as esposas, que em 2014 e após a inauguração do Templo de Salomão serviu de mula para levar três milhões de dólares em espécie. “Cada pastor e cada esposa levou em mãos 15 mil dólares. Eu e a minha esposa também levámos e entregámos os fundos aos colectores de Edir Macedo”, detalha.

Para esta reportagem, passámos dois meses à conversa com pastores, fiéis, banqueiros e políticos. São testemunhas oculares de uma verdadeira farra de dinheiro vivo.

Boom económico

A prosperidade da IURD em Angola acompanhou o boom económico do país. Fundada em 1991 pelo missionário brasileiro Kennedy Silva de Alcântara, a Igreja acompanhou o gigantesco crescimento depois de 2002, quando terminou a guerra civil, que durou 27 anos. Com a paz, veio a alta do preço do petróleo, a principal fonte de riqueza nacional. Em nove anos de paz, o produto interno bruto disparou de US $10,7 mil milhões para cerca de US $100 mil milhões.

Nos “tempos áureos” da IURD em Angola, segundo um banqueiro internacional familiarizado com as transacções da instituição que falou ao Maka Angola sob condição de anonimato, a Igreja chegava a depositar diariamente, nos bancos de Luanda, mais de um milhão de dólares em espécie.

O Maka Angola enviou um questionário à ala brasileira da IURD, cuja resposta publicamos na íntegra no fim do texto. Segundo essa resposta, “na sequência do questionário submetido a nós para efeitos de direito de resposta, vimos pela presente reiterar que os factos questionados na mesma são os que constam em sede de acusação e em fase de julgamento neste momento, pelo que não tardará e veremos os mesmos esclarecidos”. A IURD responde também que “importa reforçar que quem acusa tem o ónus da prova, ou seja, quem acusa é quem deve provar, pois quaisquer confissões desacompanhadas de elementos de prova não constituem corpo de delito”.

Segundo os cálculos do bispo angolano Valente Bizerra Luís, entre 2015 e 2017 a IURD recolhia anualmente entre 70 e 80 milhões de dólares. Além disso, a realização, duas vezes por ano, das “Fogueiras Santas” – uma campanha de arrecadação de doações – rendia um total de mais de 40 milhões de dólares. Ao todo, segundo o bispo, a IURD facturava cerca de 120 milhões de dólares anuais.

É por conta desse volume inusitado de arrecadação de dinheiro, sem pagamento de impostos e com gastos administrativos mínimos, que o bispo Edir Macedo roga pragas aos angolanos. Angola era a mina do Rei Salomão para a IURD brasileira.

O bispo Bartolomeu, um dos fundadores da Igreja em Angola, explica como funcionava o esquema. “Após a arrecadação das ofertas diárias, em Luanda, o pastor responsável juntava os valores e, no final do dia, até às 22h00, fazia a entrega à equipa de recolha de pastores brasileiros.” Segundo o bispo Bartolomeu, era proibida qualquer formalidade na entrega dos valores aos colectores brasileiros, “para que não houvesse registo escrito” dos valores entregues. Também não havia qualquer angolano no departamento de finanças da IURD. Todos os valores arrecadados eram levados a uma das principais catedrais de Luanda, a do Maculusso. “Às segundas-feiras, os brasileiros realizavam depósitos simbólicos de kwanzas [moeda angolana] nos bancos. Grande parte do dinheiro, em kwanzas, era convertido em dólares, fora do circuito legal e bancário”, denuncia o bispo. Parte desse dinheiro deixava o território nacional por estrada, através da Namíbia, até à África do Sul.

“Mulas” da fé

Alguns bispos ouvidos durante a reportagem disseram que funcionaram como “mulas” num esquema de “fuga de capitais” e lavagem de dinheiro. “Acompanhei as caravanas dos pastores, entre 50 a 60, mais as suas respectivas esposas, que levavam dinheiro em mãos, 15 mil dólares cada, para as obras nesses países”, revela o já citado pastor Inácio Jimi. Milhares e milhares de dólares eram assim transportados por estas “mulas” para a construção de catedrais nas Ilhas de São Tomé, na Costa do Marfim e em Portugal, bem como para o funcionamento da IURD na República Democrática do Congo.

Já o bispo Valente Luís lembra que a construção da Catedral do Talatona, em Luanda, consumiu mais de 30 milhões de dólares das contas da IURD. “As obras estão paralisadas e nem sequer vão em metade. O valor pago é apenas uma forma de fuga de capitais”, explica.

A empresa envolvida na construção é a Noráfrica, comandada por Marta dos Santos, irmã do ex-presidente José Eduardo dos Santos. A Noráfrica também esteve envolvida na construção de outros templos da IURD, como o do Patriota.

O bispo Valente lembra ainda que uma construtora portuguesa tinha negociado com pastores angolanos a venda de uma propriedade em Luanda por 13 milhões de dólares. “Surpreendentemente, os pastores brasileiros tomaram conta das negociações e decidiram pagar mais do que o dobro do valor acordado. Pagaram 28 milhões de dólares e ficámos a saber, mais tarde, que a diferença dos 15 milhões de dólares serviu para pagar outros serviços da IURD no Brasil e em Portugal”, garante.

Valente Luís explica que as remessas de dinheiro para o Brasil “dependiam exclusivamente das necessidades de Edir Macedo”, o fundador da IURD. Para lhe fazer chegar dinheiro, “às vezes, alugávamos um avião, que vinha de Israel vazio, para levar 250 fiéis. Cada um desses peregrinos transportava 15 mil dólares em cash. Os poucos membros brasileiros tinham direito a sair de Angola com 10 mil dólares cada”.

Por cada uma dessas viagens, os membros da IURD conseguiam retirar, em média, mais de 3,5 milhões de dólares. “Eu próprio e a minha esposa já levámos dinheiro nessas condições”, confessa o bispo Valente Luís. O bispo menciona também que em 2012 transportou dinheiro com outros pastores e respectivas esposas para apoiar a chegada da IURD ao Senegal, um país muçulmano, e a Madagáscar.

Viagens eram mais frequentes depois da Fogueira Santa

Quanto às peregrinações, inicialmente a Israel e depois ao Templo de Salomão, no Brasil, ocorriam com maior frequência depois da realização bianual da Fogueira Santa, que em média facturava mais de 20 milhões de dólares cada.

Segundo Luís Valente, na Fogueira Santa os bispos prometiam que “Deus ouviria as preces e derramaria os seus milagres a quem mais contribuísse com dinheiro e bens à igreja”.

Um antigo e influente ministro, cuja família aderiu à IURD, é peremptório em afirmar que a lavagem de capitais como actividade dessa igreja “era evidente”. “Muitos dirigentes do MPLA converteram-se à IURD. Alguns deles também usaram a igreja para branqueamento de capitais. Havia uma teia organizada e protegida pelo próprio governo”, comenta o ex-ministro, que pediu para não ser identificado. Segundo ele, a troca era recíproca, pois a Universal ajudava a reunir votos para o MPLA. Assim, na altura das campanhas eleitorais, “a IURD mobilizava a favor do MPLA, fazia cultos a favor do MPLA e estava muito ligada ao poder”.

Ex-subordinados denunciam humilhações e abandono

O porta-voz da Comissão Reformista da IURD, Inácio Jimi, explica como tem sido possível o domínio dos pastores e dos bispos brasileiros em Angola, quando são apenas, no plano legal e formal, meros convidados dos seus homólogos angolanos.

“Nós havíamos reconhecido Edir Macedo como o nosso líder espiritual e os primeiros missionários brasileiros como aqueles que nos ensinariam a exercer o ministério espiritual”, explica Inácio Jimi. “Assim, o líder angolano da igreja passava uma procuração irrevogável para o delegado brasileiro de Edir Macedo exercer a gestão da Igreja [em Angola]. À medida que esta foi crescendo, os missionários brasileiros abusavam cada vez mais do poder que lhes era conferido”, realça Inácio Jimi.

O pastor afirma que a obediência cega às ordens vindas do Brasil, de Edir Macedo, era fruto da falta de visão e da incapacidade, na altura, dos angolanos para controlarem o seu próprio destino. Mantinham-nos nesse estado com um rol de proibições: os pastores angolanos não podiam estudar nem receber visitas de familiares em sua casa; não podiam ter conta bancária excepto para receber salários da Igreja, que apenas podiam gastar em alimentação e vestuário.

“Disseram-nos que tínhamos de largar a escola e o trabalho. Não podíamos ter bens, nem casa própria, nem montar negócio. Com o decorrer do tempo, notámos como os colegas brasileiros tinham tudo isso e prosperavam”, explica Carvalho Andrade, membro da igreja há 25 anos e pastor há 21. “Por imposição da igreja, abandonei os meus estudos na 8.ª Classe”, diz o pastor, que trabalhou para a IURD em seis províncias.

O bispo João Bernardo exemplifica: “O pastor angolano está proibido de comprar terreno, casa, carro, vestuário ou calçado de marca, mesmo com o seu próprio salário.” E conta que os servos de Edir Macedo em Angola também não têm direito a férias. “Passei 25 anos a trabalhar sem férias”, denuncia.

A relação entre pastores brasileiros e angolanos é bem patente no caso do obreiro local José Francisco Miguel, falecido em 2014, após um acidente de carro ao serviço da IURD. A viúva Edna Miguel, também obreira da igreja, conta ao Maka Angola que o seu marido foi chamado pelo pastor brasileiro Basílio Amões, para montar o som nas catedrais do Sumbe e Benguela. No carro em que viajava, José Francisco Miguel sofreu um acidente, e teve traumatismo craniano encefálico.

“O meu esposo estava em estado grave e o hospital local não tinha condições. Os pastores não queriam que eu o visitasse. Tive de me impor para ele ser transferido para Luanda e depois para a Namíbia, onde esteve internado três meses”, explica. “Uma funcionária visitou-me em nome do pastor brasileiro Marcelo da Cunha Medeiros para me informar que este exigiu que se desligasse a máquina que o mantinha vivo na UTI, porque a IURD estava a gastar muito dinheiro”, denuncia.

Segundo ela, a IURD cessou os pagamentos, o paciente foi retirado da UTI e faleceu em seguida. “Eu fui das primeiras a entrar para a igreja, em 1991. A liderança brasileira nunca teve consideração pelos angolanos. O pastor Basílio Amões chegou a dizer-me na cara: ‘eu sou branco e estou aqui para fazer-vos um favor’”, afirma.

Edna Miguel lamenta apenas o longo tempo que os membros angolanos da IURD demoraram a tomar o seu controlo. “Os brasileiros sempre trataram os angolanos como inferiores, e isso só foi possível porque não permitiam pessoas com estudos ou independência financeira na hierarquia da Igreja. Tinham de ser pessoas totalmente dependentes dos seus esquemas para o sustento.”

Outro caso lembrado pelos entrevistados foi o do pastor e médico Maurício Filipe. O bispo João Bartolomeu conta que o bispo brasileiro João Leite autorizou há alguns anos, à revelia de Edir Macedo, a formação universitária de seis pastores. Os bispos João Bartolomeu e Fellner Batalha formaram-se em Direito e Administração e Gestão, respectivamente. Os pastores Maurício Filipe, em Medicina; Ernesto Keta, em Direito, e  David Viega e Bartolomeu Bango em Comunicação Social.

“Quando o enviado de Edir Macedo, o bispo Honorilton Gonçalves, chegou a Angola, há 11 meses, chamou o pastor e médico Maurício Filipe e deu-lhe a escolher entre ser médico e ser pastor. Para continuar como pastor tinha de abandonar a medicina”, ilustra o bispo João Bartolomeu. “Num país como Angola, com falta de médicos, o Maurício Filipe foi proibido de ajudar os necessitados com a sua profissão. Por discordar, foi desligado da Igreja.”

As proibições não se fiam por aqui. Segundo os entrevistados, há um rol mais alargado de privações a que os pastores angolanos foram sujeitos.

A coacção para a vasectomia

A mais contenciosa de todas essas privações é a obrigação de os pastores serem submetidos à vasectomia para não terem filhos. Edir Macedo, fundador da IURD, tem filhos, assim como os brasileiros que envia para Angola, incluindo o seu delegado informal Honorilton Gonçalves

Em 2019, Inácio Jimi submeteu-se à vasectomia na África do Sul. Antes disso, tivera dois filhos. “A IURD pagou a minha viagem e todas as despesas médicas e de estadia”, diz. “Fiz a vasectomia para evitar a coacção constante dos pastores e bispos brasileiros, em particular o bispo Carlos Alberto. Em todos os cultos e eventos em que nos reuníamos, diziam-nos sempre, aos que não se tinham submetido à vasectomia, que o nosso coração não estava com Deus”, afirma Inácio Jimi.

Colectivamente, os pastores angolanos reclamam também do facto de serem obrigados a partilhar habitação entre si. Para o escritor angolano Sousa Jamba, que tem acompanhado os fenómenos religiosos no interior de Angola, “essa estratégia visa colocar os pastores em situação de vigia mútua”.

A rebelião – e a lentidão do governo

Em 2019, o caldo entornou-se para os pastores brasileiros da IURD. Os 65 pastores brasileiros, concentrados maioritariamente nos principais templos da capital, Luanda, viram-se em número ínfimo para manter o controlo da Igreja. Dos pouco mais de 400 bispos e pastores angolanos, 307 aderiram à convocatória da Assembleia-Geral Extraordinária, que aconteceu em 24 de Junho de 2019. Segundo o artigo 14.º dos Estatutos da IURD em Angola, a convocação de tal assembleia requer apenas mais de metade dos membros.

Os participantes deliberaram a favor da destituição e dissolução da Direcção da IURD, formalmente liderada pelo bispo angolano António Correia da Silva, que se encontra no Brasil desde o início de 2019. Com uma procuração irrevogável passada pelo bispo da Silva, quem na verdade comandava a igreja era o enviado de Edir Macedo, o bispo Honorilton Gonçalves.

Os colegas brasileiros foram acusados de “discriminação racial e violação das normas estatutárias; imposição e coacção a castração ou vasectomia aos pastores, apegando-se a heresias”. São também acusados da prática de variados crimes, como a falsificação e abuso de confiança. Nesse dia, Valente Bizerra Luís emergiu como o novo líder da IURD em Angola.

Valente Bizerra Luís, o pastor que assumiu a liderança da IURD em Angola

Com menos de 80 pastores angolanos do seu lado, os brasileiros não tiveram como interpor uma providência cautelar para suspender os efeitos da assembleia, a nova Direcção e as deliberações tomadas por esta.

Mesmo assim, segundo o advogado Euclides Arão, pro causa da “teia de influências” da Igreja, os rebelados enfrentaram problemas. A nova Direcção da IURD angolana passou por três cartórios até conseguir que a acta do evento fosse reconhecida por um notário. “Nesses cartórios informaram-nos que não podiam reconhecer a acta sem ordens superiores.”

Somente um mês depois da realização da Assembleia-Geral Extraordinária, e após o reconhecimento notarial pelo 4.º Cartório de Luanda, a acta foi formalizada com a publicação no Diário da República de 24 de Julho de 2020.

No meio da confusão política, o Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos, através do 4.º Cartório de Luanda, chegou a denunciar o reconhecimento notarial como sendo fraudulento. Um membro do governo, que pediu para não ser identificado, explicou ao Maka Angola que essa reviravolta serviu apenas “como medida cautelosa de gestão política e diplomática”. Segundo ele, a IURD “continua a manter tentáculos muito fortes no governo e na administração pública”. 

No dia 14 de Agosto de 2020, a PGR de Angola comunicou a apreensão, na capital Luanda, das sete principais catedrais da Igreja Universal do Reino de Deus. 

Em nota à imprensa, a PGR revelou que as “referidas apreensões resultam do facto de existirem nos autos indícios bastantes da prática dos crimes de associação criminosa, fraude fiscal, exportação ilícita de capitais, abuso de confiança, de entre outros indícios de natureza análoga”.

Já o membro do governo entrevistado nesta reportagem diz que a PGR demorou três semanas pata executar a apreensão dos templos após a decisão ter sido tomada. “Há lá muitos IURD e muito fanatismo ainda”, assevera.

“A IURD Brasil nunca fez qualquer investimento em Angola. Todo o património da Igreja foi construído com fundos angolanos”, denuncia o bispo Valente Bizerra Luís.

De acordo com os seus estatutos, a IURD Angola tem autonomia patrimonial e financeira. “Isso quer dizer que os bens que a IURD Angola tenha adquirido em Angola, bem como as doações que tenha obtido são sua pertença”, assevera o analista jurídico do Maka Angola e académico na Universidade de Oxford, Rui Verde.

Em 1992, o governo reconheceu a IURD através do Decreto Executivo do Ministro da Justiça n.º 31-B/92, de 17 de Julho. A IURD passou a ter o estatuto de uma entidade colectiva autónoma em Angola, com capacidade de gestão administrativa, financeira e patrimonial. Para o reconhecimento da Igreja, havia sido criada uma comissão instaladora constituída exclusivamente por angolanos. Não reza a participação legal de nenhum brasileiro no processo de registo da entidade, nem um pedido de Edir Macedo ou seu delegado para constituir uma representação em Angola.

Por conta desse arranjo, para o jurisconsulto Rui Verde, “ao contrário do que se possa pensar, do ponto de vista jurídico, a IURD não é uma entidade brasileira com uma filial em Angola”. Segundo ele, “não existe tutela, subordinação ou qualquer outra forma de domínio jurídico entre Brasil e Angola”.

O caso da IURD em Angola é um exemplo de como, em certa medida, os angolanos têm uma soberania político-constitucional meramente formal. Passados cinco séculos, Angola é confrontada com uma nova saga missionária que traz à memória a intrínseca ligação de Angola ao Brasil, através do tráfico transatlântico de escravos. Desta feita, é apenas o dinheiro que interessa, e não as peças humanas. Em termos práticos, mantém-se a mentalidade do contratado do tempo colonial, porque as autoridades governativas preocupam-se apenas com aspectos formais político-constitucionais e não com o desenvolvimento e o progresso colectivos dos angolanos, que devem ser alicerçados na liberdade de pensamento e na educação.

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