O Acórdão de Zenú e a Pista Chinesa

Como era de esperar, deu brado a decisão do Tribunal Constitucional que declarou inconstitucional o julgamento de José Filomeno dos Santos (Zenú), Valter Filipe (antigo governador do Banco Nacional de Angola) e outros. As consequências desse acórdão (n.º 883/2024) ainda não são claras. Por isso, da nossa parte, afastamos as interpretações maximalistas, quer no sentido de o acórdão terminar imediatamente com o processo, quer no sentido de exigir um novo e completo julgamento. A lei – assim como o próprio acórdão – não diz uma coisa nem outra. Apenas determina que o Tribunal Supremo tem de reformular a decisão. Isto é, tem de a modificar de acordo com a decisão do Tribunal Constitucional. O acórdão apenas manda expurgar as inconstitucionalidades. O que nos parece mais interessante, é prever a influência que este acórdão poderá ter noutros casos, como o dos generais Manuel Hélder Vieira Dias Júnior “Kopelipa” e Leopoldino Fragoso […]

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A Inconstitucionalidade de Zenú

Com data de 3 de Abril de 2024, o Tribunal Constitucional, com unanimidade de dez juízes, adoptou o acórdão n.º 833/2024, em que eram recorrentes José Filomeno dos Santos, Valter Filipe, Jorge Sebastião e António Manuel. Tratou-se de uma decisão do famoso “caso dos 500 milhões”. A conclusão do Tribunal foi que o acórdão condenatório do Tribunal Supremo violara os princípios constitucionais da legalidade, do contraditório, do julgamento justo e conforme, e do direito à defesa. Como consequência, “os autos devem baixar à instância devida, para que sejam expurgadas as inconstitucionalidades verificadas, ao que se seguirão os trâmites subsequentes que se mostrem cabíveis” (acórdão n.º 833/2924, p. 22). São vários os comentários e as consequências que se retiram deste acórdão, que em certa medida pode ser chamada “histórico”, sobretudo pelo provável impacto que terá na actual metodologia utilizada no combate à corrupção. Em primeiro lugar, do ponto de vista do […]

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Corrupção e Boa Governação: a Insustentável Leveza do Direito

Brasil: Lava Jacto, hoje Em 31 de Janeiro, José Dias Toffoli, juiz do Supremo Tribunal Federal do Brasil, suspendeu o pagamento de uma multa de US$ 2,6 mil milhões que fora imposta à Novonor, uma empresa de construção mais conhecida pelo seu antigo nome, Odebrecht. No mês anterior, suspendeu outra multa aplicada à J&F, dona do maior frigorífico do mundo, a JBS. Ambas as empresas tinham concordado com o pagamento as multas, no âmbito dos acordos estabelecidos com as autoridades judiciais, nos quais as respectivas administrações admitiram ter subornado autoridades brasileiras. Toffoli decidiu que havia dúvidas razoáveis sobre se os acordos haviam sido assinados voluntariamente (sem coacção) e argumentou que o juiz que administrou as multas poderia ter conspirado com os procuradores. As multas tinham sido estipuladas após uma série de investigações de corrupção no Brasil, a mais famosa das quais, conhecida como Lava Jacto, iniciada há dez anos. A […]

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A Instrução Contraditória do Caso Kopelipa

Decorreu na semana passada uma audiência referente à instrução contraditória do caso penal em que são arguidos os generais Kopelipa e Dino, o advogado Fernando Gomes dos Santos, o cidadão chinês You Haming e as companhias CIF, Plasmart International Limited e Utter Right International Limited. A instrução contraditória não é um julgamento, nem representa qualquer decisão final, ou próxima do final, de um caso criminal. É apenas uma fase inicial em que, pela primeira vez, um juiz averigua da viabilidade da acusação feita pela Procuradoria-Geral da República (PGR) / Ministério Público (MP). Aqui não se trata de condenar ou absolver o general Kopelipa e os restantes, mas somente de obter uma decisão de um juiz que confirme ou negue o mérito da acusação, com vista a submeter o arguido a julgamento ou a arquivar o processo (artigo 332.º do Código de Processo Penal – CPP). A decisão do juiz pode […]

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A Ressurreição de Sam Pa

Dimanando das brumas, o fantasma de Sam Pa ressurgiu no final do ano passado, em Luanda, para tentar intimidar o general Kopelipa, assombrando a consistência do processo judicial que contra ele (e o general Dino) corre em Angola. Em 21 de Dezembro, deu entrada na Sala de Comércio, Propriedade Intelectual e Industrial da Comarca de Luanda uma acção de impugnação de cedência de quotas sociais entre vivos e alienação de património de sociedade comercial, tendo o famoso advogado Benja Satula e Carlota Cambenje como mandatários principais. Parece uma acção normalíssima, mas não é. Os autores da acção são duas empresas com sede nas Ilhas Virgens Britânicas – a Utter International Limited e a Plansmart International Limited –, ambas representadas por Luo Zhigang, um chinês com residência em Luanda. As rés são a IF – Investimentos Financeiros SGPS, SA, de Luanda, e o CIF – China International Fund Lda, também com […]

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Nova Lei da Amnistia: Resultados Práticos

Em alguns aspectos, Angola é um país feliz. Com alguma regularidade, os seus órgãos de soberania promovem uma lei da amnistia. Não vale a pena, para justificar tais leis, falar das velhas tradições romanas de amnistia, e muito menos do perdão na cultura tradicional africana, ou de como esta constituiu a argamassa da nova África do Sul. A amnistia é uma forma de encontro de uma sociedade com todos os seus entes, privilegiando uma cultura de consenso e integração e, nessa medida, deve ser vista de forma positiva. Contudo, é evidente que no âmbito do chamado combate à corrupção em Angola, do ponto de vista político e da simbologia, uma nova lei da amnistia levanta algumas dúvidas ou questões. Desde logo, é difícil de a encarar à luz das recentes declarações de um juiz do Tribunal Supremo, que, num exercício de extrema fustigação judicial, considerou inadmissível qualquer contemporização com os […]

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Injustiça em Tempo de Crise

Em cinco anos de combate à corrupção, Augusto Tomás é o único antigo ministro condenado e a cumprir pena efectiva de prisão. Recentemente, foi-lhe recusada a liberdade condicional por uma decisão do Tribunal Supremo cuja falta de fundamentação legal revoltou a comunidade jurídica nacional. Esta reacção significa que a paz social foi mais ameaçada pela permanência de Tomás na prisão do que pela possibilidade da sua libertação. Não quer isto dizer que Tomás seja um santo ou uma figura exemplar: todos se lembram do seu comportamento arrogante e altaneiro enquanto ministro. Mas não é isso que está em causa, porque não compete aos tribunais julgar a arrogância. Em contrapartida, mantém-se um confrangedor e absoluto silêncio relativamente ao caso de Manuel Vicente. Terminado o período de imunidade constitucional (que na realidade não existia, mas esse é outro tema de que não iremos agora tratar), a justiça nada diz sobre as acusações […]

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Delfins de JES Acusados na Hora da Sua Morte

Na sombra da morte de José Eduardo dos Santos (JES), na passada sexta-feira, dia 8 de Julho de 2022, surgiu o despacho de acusação criminal contra os seus principais delfins, os generais Manuel Hélder Vieira Dias Júnior (“Kopelipa”) e Leopoldino Fragoso do Nascimento (“Dino”). Trata-se de uma acusação datada de 4 de Julho, assinada por três procuradores do Ministério Público (MP) junto do Tribunal Supremo: Pedro Carvalho, Manuel Bambi e Gilberto Vunge. O despacho de acusação tem 80 páginas e 223 artigos, contando com 36 testemunhas. O general Kopelipa é acusado de sete crimes: peculato, burla, falsificação de documentos, associação criminosa, tráfico de influências, abuso de poder e branqueamento de capitais. Por sua vez, ao general Dino é imputada a prática de cinco crimes: burla, falsificação de documentos, associação criminosa, tráfico de influências e branqueamento de capitais. No mesmo despacho são igualmente acusados o cidadão chinês You Haming e o […]

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O Estado Angolano no Bolso da Odebrecht

Há algo de estranho nas apropriações públicas, por parte da Procuradoria-Geral da República (PGR), de bens supostamente obtidos de forma ilegal. O Estado angolano recupera, através de uma “entrega voluntária”, uma fábrica que não apresenta lucros e que tem uma dívida superior ao seu valor real, no total de 500 milhões de dólares. Trata-se de uma mais-valia ou de um prejuízo para o Estado, o qual terá de arcar com esta dívida? É isto que se passa no caso da Biocom, a empresa de produção de açúcar e etanol, cuja gestão se mantém nas mãos da Odebrecht, possivelmente para seu benefício exclusivo, e de forma ruinosa para os interesses angolanos. Analisemos. Em Outubro de 2020, a PGR anunciou a entrega ao Estado da totalidade das acções (40%) detidas pelos generais Leopoldino do Nascimento (Dino) e Manuel Vieira Dias Júnior (Kopelipa) na empresa Biocom – Companhia de Bioenergia de Angola. A […]

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Novo Código Penal: Alguns Perigos à Espreita

A Lei n.º 38/20, de 11 de Novembro, que aprova o Código Penal foi publicada no dia da comemoração da independência nacional. Finalmente, após 45 anos, Angola tem o seu próprio Código Penal e deixa de se reger por uma lei portuguesa do século XIX. Este mero facto é de aplaudir e de registar como muito positivo. Daqui a 90 dias, em Fevereiro de 2021, o Código entrará em vigor em todo o país. O novo Código Penal angolano é composto por dois livros e 473 artigos. O primeiro livro dedica-se à parte geral do direito penal, isto é: as condições em que há crime, em que este pode ser afastado, e como deve ser punido, englobando os artigos 1.º a 146.º. O segundo livro (artigos 147.º a 473.º) estabelece a parte especial, identificando os crimes concretos que são puníveis e as suas penas (homicídio, furto, etc.). DESCOLONIZAÇÃO NO DIREITO […]

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