A Nudez da Justiça no Tribunal Supremo

Warren Buffet, célebre investidor norte-americano, Warren Buffet, diz muitas vezes: “Quando a maré desce é que se vê quem está a nadar sem calções.”

Um exemplo típico da descida da maré que põe a nu a completa inoperância de um sector fundamental do Estado é a justiça angolana.

Nos tempos mais recentes, temos visto os problemas com os técnicos de justiça da Procuradoria-Geral da República a propósito da decisão de greve do Sindicato Nacional dos Técnicos de Justiça e Administrativos da Procuradoria-Geral da República (PGR); tomámos conhecimento do manifesto do Sindicato dos Oficiais de Justiça, que identificava com clareza os vários problemas concretos e graves da justiça em Angola; e, mais recentemente ainda, soubemos da notificação judicial avulsa requerida pela Associação de Juízes de Angola relativamente ao poder executivo. Tanto quanto apurámos, este requerimento terá desencadeado uma “caça às bruxas”, no seio da magistratura judicial, por parte de elementos afectos ao poder, os conhecidos “bajuladores”, que terão instaurado um inquérito às actuações dos magistrados requerentes.

Todos estes acontecimentos recentes, a que acresce a falta de condições nas prisões, também denunciada em vários locais, comprovam que a justiça angolana não existe enquanto poder do Estado.

A completar o panorama, acabámos de saber da convocação de greve por parte dos funcionários do Tribunal Supremo, presidido por Manuel Aragão, a partir de Julho de 2017.

As reivindicações dos funcionários do Tribunal Supremo são simples, e espelham as dificuldades deste e doutros sectores -como a Educação – que durante anos e anos foram maltratados pelo poder político, empenhado no enriquecimento individual dos seus representantes, e não em dotar os Estado de serviços e quadros adequados.

Os funcionários debatem agora questões básicas: equiparação salarial, promoções, formação profissional, saúde e complementos salariais. Além disso, denunciam a absoluta falta de meios para trabalhar, como a inexistência de papel, carimbos, tecnologias de informação, casas de banho, tinteiros, bebedouros, etc.

Rapidamente se percebe, assim, que estas reivindicações são semelhantes às das outras greves que têm sido levadas a cabo. Isso clarifica um facto muito simples: o governo levou o Estado à falência e agora não tem dinheiro para cumprir com os mínimos necessários para garantir o funcionamento dos serviços públicos.

Prova disto é a resposta do secretário-geral do Tribunal Supremo, Vicente Félix, com visto de Manuel Costa Aragão, juiz conselheiro presidente da mesma instituição, ao caderno reivindicativo dos funcionários. Ao longo de cinco páginas, é recorrente a instrução para “aguardar” e a explicação de que “a situação financeira é factor impeditivo”. Não há uma única solução, uma única resposta construtiva, um único compromisso.

Basicamente, tudo se resume a adiar porque não há dinheiro. Ora esta não é diferente das respostas que temos lido e ouvido nos outros sectores por onde se propagam as greves ou onde abunda a escassez de tudo, como a saúde.

O governo do MPLA presidido por José Eduardo dos Santos conduziu o país a uma situação infelizmente inequívoca: não há dinheiro para a justiça; não há dinheiro para a educação; não há dinheiro para a saúde.

Pergunta-se: há dinheiro para quê? Para comprar Lexus para os deputados por 78 milhões de dólares? Para os generais andarem a passear as suas belas namoradas de jacto privado pelos comícios do MPLA?

Ao contrário do que se possa pensar, há uma ligação directa entre a corrupção que devasta o país e a falta de dinheiro nos tribunais: o dinheiro de um país é um “bolo” finito. Se o “bolo” tem 500 e tiramos 400 para gastar na Europa, só ficam 100 para Angola. Não se faz crescer nem multiplicar o “bolo”. Assim, todos os recursos consumidos pela corrupção são recursos que não vão para a justiça, a educação ou a saúde.

Qualquer dirigente angolano que queira voltar a ter um país funcional tem que começar por fazer o seguinte: repatriar os “investimentos” e as contas off-shore que as PEP (Pessoas Expostas Politicamente, como o presidente, os seus filhos, os ministros e os ex-ministros, etc.) têm pelo mundo fora.

Portugal, Espanha, Reino Unido, Malta, Caimão, Estados Unidos, Maurícias e muitos outros países têm que ser varridos pelas autoridades angolanas, e todos os fundos directa ou indirectamente pertencentes aos PEP devem ser congelados e repatriados para o Estado angolano.

É só esta a resposta que tem que ser dada aos funcionários do Tribunal Supremo e a todos os outros que vivem à míngua: o dinheiro será recuperado e usado onde tem que ser usado, para usufruto daqueles a quem esse mesmo dinheiro pertence, ou seja, os cidadãos de Angola.

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