Juízes e Professores: Angola Tem de Inovar

Há uns dias houve um grande encontro de investigadores africanos, promovido pela Academia Africana de Ciências e a Universidade de Oxford. Com ligações a Angola apenas estava presente um membro da equipa do Maka Angola. As únicas referências feitas ao país foram para dizer que era dos poucos que não tinham qualquer membro na Academia de Ciências, e que estava na cauda da lista dos países africanos no que respeita à produção científica.

Em resumo, no contexto africano, onde quer apresentar-se como grande potência em termos de investigação científica, Angola está pendurada na cauda. Na realidade, tirando a produção do petróleo e de falsos bilionários, Angola infelizmente surge sempre na cauda das listas africanas.

Para sair da cauda, Angola tem de investir na educação, na ciência, na formação de quadros e na aprendizagem.

Já referimos muito recentemente o problema da educação com que o país se defronta e o qual não resolve. Duas intervenções recentes chamaram a atenção para a importância da qualificação dos quadros superiores de Angola.

A formação de magistrados

Uma primeira foi o discurso de posse de Luzia Sebastião como directora do INEJ (Instituto de Estudos Judiciários), a escola dos juízes. A nova directora defendeu que a formação dos juízes se deve profissionalizar. E profissionalizar quer dizer que a escola deve ter um corpo docente próprio e imitar o modelo do CEJ (Centro de Estudos Judiciários) de Portugal.

Não há dúvida de que existem muitas deficiências na preparação constitucional e técnica de muitos juízes, e ao longo dos anos temos demonstrado isso mesmo no Maka Angola. Nesse sentido, é fulcral tornar a formação dos futuros magistrados mais rigorosa e exigente.

Contudo, temos muitas dúvidas de que isso seja alcançável por imitação do modelo português. A nova directora do INEJ, além de conversar com a ministra da Justiça lusa, deveria ouvir o que os advogados portugueses têm a dizer sobre a actual formação dos magistrados portugueses para perceber que este modelo não é o ideal. Sobretudo, o seu transporte para Angola permitiria transformar o INEJ numa escola completamente fechada de elites auto-suficientes, sem abertura à inovação, e completamente mecanizados na obediência ao poder instituído.

Um dos erros que não se pode cometer na necessária qualificação de quadros em Angola é limitarmo-nos a imitar modelos estrangeiros. A formação de magistrados em Angola tem de começar pela teoria, e com teorias vindas de todo o mundo. Como se sabe, a formação-base dos universitários angolanos é muito diversa. Em Angola, a qualidade do ensino universitário é em geral demasiado discutível, e depois há muitos estudantes que fazem as suas licenciaturas noutros países, com diferentes sistemas jurídicos. Por isso, ao contrário do que a directora afirma, no caso concreto angolano, o ensino do magistrado tem de começar pela teoria. Nesse sentido, tem lógica haver um corpo diferenciado de professores convidados que venham de diferentes universidades e transmitam saberes e visões diversas, para evitar tentações autoritárias. Depois, a prática tem de começar pela prática… Isto é, os magistrados devem “mergulhar” nos tribunais e aprender fazendo. Só numa fase final devem ser entregues aos seus colegas mais velhos para desenvolverem experiência.

Sim, tem de haver um modelo novo de formação de magistrados que seja rigoroso, exigente e ensine o respeito pela Constituição, mas esse modelo não deve ser mais uma imitação de ninguém, mas uma construção para Angola.

E os professores?

A questão da qualificação e admissão de novos professores também foi abordada pelo professor universitário Paulo de Carvalho. Este sociólogo, famoso por ter tentado demonstrar que José Eduardo dos Santos não era um ditador porque não mandara assassinar Rafael Marques, veio zurzir o Ministério da Educação por ter admitido professores que reprovaram nos concursos de admissão. O seu raciocínio desenvolve-se de forma elegante e lógica ao longo de vários parágrafos. O raciocínio é inatacável, excepto dos pressupostos de que parte. Se em Angola houvesse muitos professores, se a escolha fosse alargada, se existisse um sistema de ensino funcional, então tudo o que Carvalho afirma sobre não se dever deixar admitir pessoas que reprovam nos concursos estaria certo. Mas qual é a alternativa? Não haver professores? Importar professores de Portugal?

É aqui que a necessidade de inovar se impõe. Angola não necessita de cursos tão longos e pesados como os que tem. Pode perfeitamente haver um curso de seis meses ou um ano para os candidatos reprovados, que lhes dê as qualificações básicas necessárias para serem professores. As escolas não podem ficar sem professores. Se existe motivação, aquilo que se chama “amor à camisola”, o reprovado empenhar-se-á em obter qualificações rapidamente.

Portanto, a solução não é zurzir o Ministério da Educação, mas convidá-lo a inovar e arranjar uma solução de formação avançada para os professores admitidos sem qualificações. Não estão qualificados, qualifiquemo-los!

Porque é que os dirigentes do MPLA, que reprovam sempre nos seus actos de governação, são sempre promovidos para outros cargos e nunca aprendem? Ou a burrice é também um domínio exclusivo dos detentores do poder?

As elites angolanas têm de se abrir ao mundo, não para esconder e esbanjar dinheiro roubado, mas para abrir as janelas do conhecimento ao mundo. Abrir-se ao mundo começa por ser abrir-se a África, onde existe efectivamente uma tentativa de renascimento cultural e científico. Implica criar redes mundiais de conhecimento sobre Angola e tentar contar com todos os angolanos para construir um futuro melhor.

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