Esquecimento Crónico: Isabel dos Santos no Julgamento em Paris

O processo que opõe a PT Ventures (antiga Portugal Telecom) à Vidatel (empresa que detém a participação de Isabel dos Santos na Unitel), o qual temos acompanhado no Maka Angola (aqui e aqui), está a chegar ao seu momento da verdade.

As audiências ocorreram nos passados dias 7 a 16 de Fevereiro num hotel de Paris, tendo sido ouvidas 22 testemunhas. Em breve será anunciada a decisão do tribunal arbitral constituído sob a égide da Chambre de Commerce International de Paris.

O importante, para nós, não é a decisão, é a luz que este processo tem deitado sobre o estilo inepto e a substância vácua de Isabel dos Santos, desmontando os artifícios do marketing e das operações de relações públicas de que esta se rodeia.

A imagem que surge de Isabel dos Santos não é de uma empresária ou sequer gestora, mas de uma ave de rapina que desfalca as empresas (neste caso, a Unitel) e não sabe explicar as suas acções, nem justificar os seus comportamentos em tribunal.

No depoimento que prestou em França, embora, protegida pelo seu exército de advogados portugueses, vieram ao de cima as fragilidades de Isabel.

Perante cinco juízes arbitrais internacionais, Isabel foi confrontada com variadas questões durante mais de cinco horas. As suas respostas refugiaram-se demasiado nos vagos “não me lembro”, “não sei”.

Quem tem experiência de tribunais sabe que o recurso crónico a estas respostas costuma ser a arma dos larápios que querem esconder ou fugir a qualquer situação. Isabel utilizou esta estratégia pelo menos 40 vezes.

No quarto dia, quando questionada acerca da atribuição de bónus em dinheiro na Unitel a si própria e confrontada com a acta relativa a essa decisão, começou por dizer que não sabia se tinha comparecido em tal reunião: “Eu não sou muito boa com datas”, afirmou. Depois, leu a acta e confirmou que tinha estado presente na reunião.

Porém, quando questionada sobre o conteúdo da acta que se referia ao pagamento de bónus em dinheiro a ela e a outros administradores, respondeu: “Eu não me lembro de pagamentos de bónus. Não me lembro disso.”

No mesmo quarto dia, Isabel também foi questionada sobre o facto de a Unitel ter transferido para a sua empresa Tokeyna o direito a receber 465 milhões de dólares que haviam sido emprestados para outra empresa sua, a Unitel International Holdings, por 150 milhões de dólares, gerando, assim, uma perda para a Unitel de 315 milhões de dólares. Isabel assinou os contratos, mas não sabe os detalhes.

O diálogo que se segue entre o inquiridor e Isabel é hilariante:

“Pergunta: Reconhece a assinatura no contrato mostrado na página 23 como sendo sua?

Resposta de Isabel: Sim.

Pergunta: De acordo com este contrato, a Unitel entregava à Tokeyna o direito de ser ressarcida de sete empréstimos da UIH? Correcto?

Resposta de Isabel: Sim.

Pergunta: E em troca desse reconhecimento a Tokeyna tem de pagar 150 milhões de volta à Unitel?

Resposta de Isabel: Não sei os detalhes.

Pergunta: Tem conhecimento de que os valores devidos à Unitel eram superiores a mais de 150 milhões de dólares?

Resposta de Isabel: De novo, não sei os detalhes.

Pergunta: Sabe que este contrato causou elevados prejuízos à Unitel?

Resposta de Isabel: Eu não preparo as contas da Unitel. São os contabilistas e os serviços que as fazem. (…) Eu só aprovo as contas, não as faço.”

Esta última afirmação demonstra toda a ignorância ou maldade de Isabel. Quem assina as contas é responsável por elas e deve saber o que nelas consta. A contabilidade não é um elemento formal com o qual os administradores nada tenham a ver. A assinatura das contas tem um valor material. O administrador é o responsável pelas contas. A contabilidade corresponde a elementos materiais, isto é, a realidades de negócios feitos pelos administradores. Espelha uma realidade. E Isabel tem de conhecer a realidade que a contabilidade espelha, caso contrário não é administradora.

Mais interessante para aqueles que tentam perceber desde há muitos anos a origem dos fundos de Isabel é o diálogo acerca da Vidatel. Nesse diálogo, Isabel reconhece que a Vidatel é uma mera sociedade-veículo sem qualquer activo a não ser a participação na Unitel; que os fundos da Vidatel para constituir a Unitel foram colocados por ela; e que já no ano 2000 as decisões tomadas pela Vidatel eram suas. Contudo, ao mesmo tempo, não tem a certeza se tinha poderes legais para assinar em nome da Vidatel no mesmo ano… remetendo os esclarecimentos para os advogados. Aliás, sobre os acordos assinados pela Vidatel com os outros accionistas, Isabel não se lembra de nada, não sabe nada. É confrangedor ler as declarações dela ao tribunal arbitral.

Ao longo do seu depoimento, Isabel nunca está segura, nunca assume responsabilidades, remete para os contabilistas, para os advogados. Acaba por se colocar uma questão: afinal o que faz Isabel, se nunca sabe o que anda a fazer?

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