Os Bancos em Angola: o Problema da Estrutura Accionista

O negócio da Banca assenta na confiança e não no dinheiro, como se poderia pensar. Se há confiança num sistema bancário, este desenvolve-se e tem sucesso, se não há confiança, mesmo que haja muito dinheiro, este estagna. No fundo, se nós depositamos dinheiro num banco, é porque confiamos que este nos devolverá o dinheiro e não o fará desaparecer. Por outro lado, se um banco empresta dinheiro a uma pessoa é porque espera que esta lhe pague de volta. Se não há confiança, os bancos não funcionam.

Isto vem a propósito da presente estrutura accionista dos bancos em Angola e dos problemas que tal estrutura levanta para a confiança e o desenvolvimento das finanças angolanas. A presente estrutura é um gargalo impeditivo do crescimento.

Vejamos alguns exemplos concretos:

O BANC – Banco Angolano de Negócios e Comércio S.A. é detido pelo general Kundi Paihama em 41,49% do capital social. Uma posição mais do que significativa. O general era ministro da Defesa quando o banco foi fundado e, curiosamente, a Caixa de Segurança Social das Forças Armadas Angolanas foi também "convidada" a ser sócia do Banco… O general é neste momento governador do Huambo, e sempre ocupou cargos elevados no governo. Foi promovido a general em 1992. Desde 1999 até Fevereiro de 2010, foi ministro da Defesa Nacional. Exerceu até Abril de 2014 o cargo de ministro dos Antigos Combatentes e Veteranos da Pátria.

Quanto ao Banco Valor, embora Álvaro Sobrinho seja o seu accionista de referência, Frederico Manuel dos Santos e Silva Cardoso detém 11,26% do capital social do banco, o que é igualmente uma participação significativa. Frederico Cardoso é o secretário do Conselho de Ministros. Licenciado em Direito em Cuba, em Novembro de 2008 foi nomeado chefe da Casa Civil do presidente da República de Angola, cargo que exerceu até Fevereiro de 2010.

Outra instituição a referir é o Banco Sol. Este banco tem como accionista determinante a GEFI que detém 45% do capital através da sua subsidiária SANSUL. A GEFI – Sociedade de Gestão e Participações Financeiras é o braço financeiro do MPLA. Também no Banco Sol encontramos a mulher do presidente da República, Ana Paula dos Santos, com 10%.

(d) Finalmente, uma referência ao famoso BAI – Banco Angolano de Investimentos. O BAI foi criado em 1996. Em 2010, já era líder de mercado, com uma quota de 20%. Não entrando este texto em considerações mais amplas sobre o BAI, refira-se apenas que a sua estrutura accionista é dominada por pessoas ligadas em determinada altura à Sonangol: Manuel Vicente, José Carlos Paiva, José Massano, anterior governador do Banco Nacional de Angola e conhecido por ter construído uma mansão multimilionária na Quinta Patiño, em Cascais, avaliada em mais de 3,5 milhões de euros.

Portanto, se olharmos para os accionistas dos bancos, o que temos? Ministros e ex-ministros. Pessoas Expostas Politicamente, ligadas ao poder.

Este levantamento de personalidades conhecidas não é um exercício de bisbilhotice, nem de demagogia fácil. Pelo contrário, resulta das obrigações impostas pelas regras bancárias internacionais relativas aos PEP (Pessoas Expostas Politicamente), e que se podem resumir da seguinte forma: todas os bancos e instituições financeiras sujeitos a regulação nos EUA e na Europa, bem como em países aderentes às Convenções Internacionais sobre Branqueamento de Capitais e Corrupção (por exemplo: Convenção de Viena, Palermo ou Mérida), têm de gerir de forma muito atenta os riscos associados a altas figuras políticas estrangeiras (as PEP) e adoptar mecanismos de due dilligence (diligência eficaz) que garantam que não estão consciente ou inconscientemente a ajudar a esconder ou a mover os produtos da corrupção por políticos estrangeiros, as suas famílias ou os seus associados. Os bancos que conduzam negócios com PEPs desonestas enfrentam um risco substancial de reputação, escrutínio regulamentar adicional e possível acção de supervisão.

Tudo isto quer dizer o seguinte: bancos detidos por PEP que sejam considerados de risco por ouros bancos a operar no sistema internacional têm dificuldades acrescidas para obter liquidez nesse sistema, sobretudo porque, como se referiu no início do texto, a Banca vive de confiança e não dinheiro. Nenhum banco internacional quer estar a sujeito a pesadas multas por não cumprir as orientações de due dilligence. Actualmente, face ao valor dessas multas (muitos milhões de dólares), não compensa “fechar os olhos”. Por isso é que a banca angolana tem de ponderar muito bem acerca da sua estrutura accionista. Não é bom para a internacionalização da finança angolana e, logo, para o crescimento potencial do PIB, ter uma estrutura bancária assente em políticos ou pessoas ligadas ao governo. Este tipo de estrutura levanta suspeitas e dificuldades nos fluxos financeiros internacionais e no acesso ao crédito.

Um dos passos fundamentais para a democratização efectiva de Angola e o seu crescimento económico assenta, justamente, na despolitização da estrutura accionista da Banca.

 

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