Rapper MCK Proibido de Sair de Angola

O Serviço de Migração e Estrangeiros (SME) interditou hoje a saída do conhecido rapper MCK, no Aeroporto Internacional 4 de Fevereiro, em Luanda, impedindo-o assim de actuar no Festival Terra do Rap, a ter lugar no Rio de Janeiro, Brasil, a 26 de Novembro.

Segundo declarações prestadas por MCK ao Maka Angola, os oficiais do SME informaram-no de que “tinham instruções para interditar a minha saída, por ordens superiores”.

O rapper, de acordo com o seu testemunho, tentou saber junto dos funcionários do SME “se a ordem tinha alguma sustentação jurídica, se era por problemas com o passaporte ou visto”.

“Disseram-me apenas que eram ordens superiores e que as instruções eram no sentido de me devolverem o passaporte após a descolagem do voo da TAAG, com destino ao Rio de Janeiro, às 10h30”, explicou MCK.

Com o avião já no ar, os oficiais do SME procederam à devolução dos passaportes e dos talões de embarque ao rapper MCK e ao seu vocal back, Toy Fox.

Maka Angola tentou, em vão, contactar novamente a direcção do SME, para obter os devidos esclarecimentos. Não houve retorno das chamadas.

Por sua vez, o advogado João Faria disse ao Maka Angola que “a proibição só é possível se se tratar de uma medida de natureza judicial. Uma vez que o interditado não conhece qualquer processo legal contra si, o que aconteceu foi um acto arbitrário de natureza administrativa”.

“O MCK tem de fazer uma reclamação administrativa, por um acto de autoridade pública sem cobertura legal, de modo a que se esclareça a sua situação e a que a sua liberdade de movimentos lhe seja restituída”, aconselhou o advogado.

Festival do Rap

Segundo nota de imprensa, os pontos mais altos do Festival que decorrerá no Rio de Janeiro são a “homenagem ao lendário rapper paulistano Sabotage (1973-2003) […], com destaque também para a vinda de um dos dez rappers mais influentes da África: o angolano MCK”. O Festival do Rap destaca que MCK “vem trilhando uma carreira extraordinária e a sua música defende a construção de um mundo melhor”.

MCK tem sido um destacado activista na luta cívica, tendo nos últimos meses dedicado os seus espectáculos ao apelo pela libertação dos 15 presos políticos actualmente em julgamento, procurando angariar fundos para as famílias.

Um dos detidos, o rapper Luaty Beirão, é convidado de todos os álbuns de MCK, destacando-se ainda o dueto “A bala dói”, do álbum mais recente, Proibido Ouvir Isso:

“Sempre nos prometem comida / Mas só nos dão porrada / Nosso estômago até já grita / Mas eles têm babas que cospem balas e a bala dói / A bala bói, a bala dói [refrão] […] / Palavras estão ‘bora minadas / Esperança ficou mortelada [mutilada]”, cantam MCK e Luaty Beirão.

Sempre críticos do poder político instalado, MCK e Luaty Beirão exprimem, na sua lírica, palavras como: “Não foi a Líbia [Primavera Árabe de 2011] que me inspirou / Sou consequência do teu executivo / Revoltado sou”.

Os artistas troçam também do discurso em que José Eduardo dos Santos tentou justificar a sua incapacidade de governação ou falta de vontade política a favor dos mais pobres: “Quando nasci, já havia pobreza.” MCK lembra assim, na sua batida de 2011, porque é que esses “Tigres de papel sentem medo do Luaty”. Palavras proféticas.

“Todos os que pensam de forma diferente estão a ser alvo de perseguição política”, afirmou agora MCK.

No julgamento dos 17 activistas acusados de preparação de rebelião e tentativa de assassinato do presidente José Eduardo dos Santos, o nome de MCK consta da lista do Governo de Salvação e Unidade Nacional, apontado para ministro da Cultura. A lista, extraída pelas autoridades judiciais da internet, foi apresentada em tribunal pelo Ministério Público como prova de rebelião.

Como é do conhecimento público, esta lista é uma brincadeira do advogado Albano Pedro, na sua página de Facebook, que tentou, com os seus amigos, fazer um exercício de formação de governo: os internautas votaram em MCK para ministro da Cultura, e esta lista nada tem que ver com os detidos.

Entre as últimas actividades realizadas por MCK e que o colocaram na mira das autoridades, destaca: “O show que fiz com o Bonga a 1 de Setembro, em Portugal, teve grande repercurssão na comunicação social portuguesa e arrasou com os caciques do regime pelo apelo à liberdade e ao respeito pelos direitos humanos.”

O artista conta no seu historial com mais de cinco shows proibidos em Luanda e Benguela, assim como uma série de actos intimidatórios pela sua postura crítica em relação ao regime.

Em 2003, MCK ganhou notoriedade após a morte brutal do lavador de carros Arsénio Sebastião “Cherokee”, de 27 anos, assassinado por soldados da Unidade da Guarda Presidencial por causa da música “A Téknika, as Kausas e as Konsekuências” ou “Sei Lá o Quê, Uáué”, do seu primeiro álbum.

O lavador cantarolava a música enquanto lavava carros, no embarcadouro do Mussulo, quando os soldados presidenciais o surpreenderam, o arrastaram para a água e o afogaram pelo crime de cantar uma música de MCK.

Desde então, o rapper tem sido uma das vozes mais consequentes na luta pela liberdade de expressão, pelos direitos humanos e pela democracia, através da música.

 

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