O Berbequim e a Demagogia de Um Director de Hospital

O director-geral do Hospital Geral do Moxico (HGM), Manuel Yaza Macano, finalmente veio a público desmentir a notícia por nós publicada sobre o uso de um berbequim de pedreiro na realização de cirurgias ortopédicas.

Em manchete da Rádio Nacional de Angola (RNA), o gestor hospitalar referiu que tal informação havia sido prestada por um médico da “oposição”. Segundo Macano, esse membro da “oposição” “decidiu juntar-se a um grupo de activistas, entre eles o Rafael Marques e alguns funcionários descontentes por causa da organização e rigorosidade, para insurgir-se contra a direcção do hospital, apresentando comportamentos de descrédito, pirraça, ultraje, baixeza, e denegrir a imagem da boa governação”.

O Maka Angola reitera tudo o que escreveu sobre o uso do berbequim de pedreiro no Hospital Geral do Moxico. Manifesta-se, desde já, à disposição da Procuradoria-Geral da República (PGR) e do Serviço de Investigação Criminal (SIC). Temos, em nossa posse, provas contundentes sobre essa prática de negligência criminosa por parte do director-geral do HGM, Manuel Macano, e de quem eventualmente o proteja.

Mais uma vez, a RNA, como órgão de informação do Estado, de todos nós, esteve mal ao emitir um “desmentido” sobre uma matéria que não foi veiculada em primeira mão no seu órgão. Fê-lo sem ter consultado a fonte da matéria em questão, o Maka Angola. A RNA funcionou puramente como caixa de ressonância de um mero exercício de propaganda pessoal de um servidor público.

No dia anterior, Macano dirigiu-se à Rádio Ecclésia, acusando a suposta fonte do Maka Angola de pertencer à “oposição”. Com efeito, o dirigente hospitalar tentou ressuscitar, sob o olhar silencioso do MPLA, a velha ideia de que quem não é do partido no poder não tem o direito nem o dever de exercer a cidadania.

O director do hospital falou então num suposto movimento, incluindo nele “o activista Rafael Marques”, que pretende “insurgir-se contra a direcção do hospital e o governo”, tratando de “denegrir a imagem da boa governação”.

A Rádio Ecclésia, neste caso, não se limitou a servir de correia transmissora das alucinações de Manuel Macano. Entrevistou ainda o médico ortopedista Ogito Alberto. Apesar de recorrer a linguagem esquiva, este médico reconheceu o uso de material adaptado para as cirurgias ortopédicas.

“Existem os materiais perfuradores ou motores da AO, que são os recomendados. Mas, na ausência, temos usado isso. O que posso lhe dizer é que de momento temos esse material que estamos a usar. Mas, como lhe disse, temos usado os cuidados de assepsia nas cirurgias que temos feito até ao momento”, afirmou Ogito Alberto.

Traduzindo: material perfurador é um berbequim. Se não existe o recomendado berbequim ortopédico, como diz o médico quando se refere aos “materiais”, o que se usa então como material adaptado?

As declarações de Macano revelam apenas o seu fraco nível profissional e uma clara tentativa de politizar uma questão de saúde pública: como se o uso de um berbequim em cirurgias hospitalares fosse um problema entre o MPLA e a oposição (e activistas). Macano assume-se, cumulativamente, como director do hospital, representante do MPLA e porta-voz do governo. Falando à Rádio Ecclésia, este funcionário público vai mais longe e afirma que os pacientes do HGM e, eventualmente, a população em geral “nunca nos agradecem. Só recebemos palmatórias, só recebemos críticas”. Será que Manuel Macano tem sequer noção do que é ser um servidor público?

A boa governação a que Macano se refere, no HGM, resume-se à limpeza de material cirúrgico apenas com água da torneira e ao seu uso em múltiplos pacientes. Como reportámos, os médicos locais estão preocupados com a ausência de esterilização dos instrumentos médicos e com as elevadas probabilidades de transmissão de doenças como o HIV, a hepatite B e a tuberculose. O Moxico, como é do conhecimento público, apresenta um elevado índice de cidadãos infectados com HIV e a padecerem de hepatite B e tuberculose.

A ausência reiterada de esterilização adequada dos instrumentos cirúrgicos é obviamente das situações mais graves para a disseminação de doenças. As infecções hospitalares são a quarta maior causa de óbitos em todo o mundo. Para diminuir e evitar tais mortes, é fundamental a correcta higienização de instrumentos e utensílios médicos.

O director do Hospital do Moxico tem responsabilidades legais como dirigente e como médico. Como médico, tem o dever de garantir as melhores práticas de saúde, sendo naturalmente culpado de negligência por qualquer incidente desencadeado pelo uso de berbequins de pedreiro ou pela falta de esterilização adequada no hospital. Como dirigente, tem o dever da imparcialidade e boa administração, e não de desempenhar tristes papéis como o de porta-voz de seitas ou facções políticas.

Aguardamos o resultado das investigações da PGR e do SIC. Aliás, exigimos a investigação cabal das nossas denúncias e assumimos em tribunal responsabilidade integral pelo que escrevemos. Haja justiça!

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