Fake News no Jornal de Angola

Donald Trump não inventou as fake news. Já alguns anos antes de Cristo, o futuro imperador Augusto mandava cunhar moedas a denegrir com notícias falsas o seu rival Marco António. A mentira para manchar reputações e atingir objectivos inconfessáveis é tão velha como a história, e um hábito persistente.

Vem isto a propósito de uma notícia publicada no Jornal de Angola de 23 de Abril de 2019, assinada pelo jornalista Leonel Kassana e intitulada “Holding do extinto BESA pede condenação de sócios”.

Um leitor razoavelmente atento, mas não inteirado dos meandros do caso, ao deparar-se com a referida notícia, reteria que Álvaro Sobrinho e Carlos Silva andavam desaparecidos de Luanda, e que por isso o Tribunal Provincial de Luanda mandou publicar um edital para que estes respondessem a uma acção judicial de condenação proposta “pelo banco que aloja os activos tóxicos da antiga holding portuguesa do Banco Espírito Santo Angola (BESA)”. O jornalista adianta ainda que “o tribunal dá aos visados 20 dias prorrogáveis por 30, para contestarem os termos da acção que lhes é movida, com a advertência de, a não o fazerem, serem considerados confessados os factos articulados pela autora na acção conforme a petição inicial”.

Na prática, esta notícia coloca a ênfase em Álvaro Sobrinho e Carlos Silva, enquanto alvos da acção e de certa maneira “fugidos” ao cumprimento dos deveres judiciais.

Contudo, basta ler o edital para as dúvidas surgirem. Com data de 29 de Março de 2018, o edital refere-se ao processo n.º 2582/2017-A. Ora, decorreu mais de um ano desde a sua publicação. Por que razão surge agora com o relevo assinalável que lhe dá o Jornal de Angola? Pode pensar-se que ninguém contestou a referida acção.

Todavia, isto não é verdade. Álvaro Sobrinho, que aparece em destaque na notícia, contestou essa acção a 7 de Maio de 2018. Há cerca de um ano! Quer isto dizer que certamente o edital e a notícia em causa não se referem a Álvaro Sobrinho, facto que evidentemente deveria ter sido explicitado.

Consequentemente, na forma como está redigido, o edital está errado e é ofensivo da reputação de pelo menos um dos réus da acção, como também o é a notícia do Jornal de Angola.

Sobrinho contestou a acção judicial há um ano, e surge agora referenciado como estando em paradeiro desconhecido e na iminência de confessar factos que já negou…

Não restam dúvidas de que estamos perante uma manipulação.

Não queremos acreditar que a juíza Henrizilda Tomé Pires dos Santos Nascimento, que assinou o edital em Março de 2018 – e foi uma das felizes contempladas entre os trinta juízes que passaram à segunda fase do concurso para juiz desembargador do Tribunal da Relação de Luanda –, tenha agora dado uma ordem ilegal de publicação do anúncio que coloca em causa a boa reputação daqueles que já contestaram a acção, como é o caso de Álvaro Sobrinho.

Quanto a Carlos Silva, afiança que nunca foi citado, nem por via postal, nem por outra qualquer via, pelo que será abusivo mencionarem o seu nome no edital. Aliás, acaba por ser estranha a sua inserção no rol dos réus desta acção, uma vez que abandonou qualquer cargo de gestão do banco em 2005, muito antes dos acontecimentos que levaram à sua transformação em Banco Económico a partir de 2014, sendo que apenas possuía 0,01% das acções.

A prática do Jornal de Angola em divulgar estas notícias sem proceder a confirmação prévia junto das várias partes envolvidas também é bizarra e merecedora de censura deontológica. Recordemos que o mesmo jornal se viu recentemente envolvido na publicação de notícias erradas sobre Álvaro Sobrinho e a banca. Neste caso, tratou-se do anúncio da sua demissão da presidência do Conselho de Administração do Banco Valor, quando ele não o tinha feito. Esse anúncio teve um efeito muito perverso, que foi o arquivamento, por parte do Banco Nacional de Angola (BNA), do processo referente à certificação da idoneidade de Sobrinho para o exercício desse cargo. Isto significa que o BNA, agindo com base numa notícia incorrecta do Jornal de Angola, encerrou um procedimento administrativo, o que naturalmente não devia ter acontecido, quer porque a notícia era falsa, quer porque não se decidem processos oficiais com base em notícias dos jornais. Resta concluir que o Jornal de Angola está a guiar-se por determinadas linhas de influência no que à banca diz respeito, criando assuntos que não são assuntos. Possivelmente, as mãos influenciadoras serão as empresas que aparecem discretamente – Portmill e Geni –, quase sempre ligadas a Manuel Vicente e a Dino do Nascimento, que se apoderaram do BESA em parceria com a Lektron, identificada erradamente como chinesa, pois pertence aos mesmos homens-fortes de José Eduardo dos Santos, bem como o governador do BNA, conivente com todo o imbróglio do BESA.

Temos aqui uma espécie de estratégia corta-fogo. Aqueles que ficaram com o BESA, como já descrevemos (ver aqui e aqui), ou seja, Manuel Vicente, Dino do Nascimento e Kopelipa, bem como Lima Massano, que, enquanto governador do BNA foi cúmplice da tomada de poder, lançam fumaças de suspeita contra Álvaro Sobrinho e outros que, quando se deu o “golpe” no BESA, não estavam na instituição, nem participaram na Assembleia-Geral da sua transformação em Banco Económico.

É evidente que os novos tempos que João Lourenço anuncia – e que tão difíceis estão a ser de implementar – fizeram entender aos perpetradores do apoderamento ilícito do BESA que serão chamados a prestar contas mais cedo do que pensariam, e é por isso que eles se desdobram em campanhas de desinformação e manipulação da opinião pública que têm de ser constantemente escrutinadas e devidamente desmontadas.

Logo, para registo presente e futuro, aqui se torna público que o edital mencionado no Jornal de Angola não pode e não devia referir-se a Álvaro Sobrinho, uma vez que este já contestou e negou a referida acção em Maio de 2018, e que Carlos Silva assevera nunca ter sido citado por qualquer meio. Que seja reposta a verdade.

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