Assassinato em Directo: o Comunicado da PGR

Algumas horas depois de termos publicado as nossas perplexidades face à actuação da Procuradoria-Geral da República no caso do assassinato em directo perpetrado pelo SIC, esta emitiu um comunicado de imprensa, através do seu director de comunicação e imprensa, Álvaro da Silva João.

Nesse comunicado de imprensa, são dadas algumas respostas às questões que levantámos. A PGR confirma que instaurou um processo-crime ao sete agentes do SIC envolvidos no assassinato e que, após os interrogatórios, o autor dos disparos foi preso preventivamente.

Não podemos deixar de saudar o comunicado da PGR e as medidas tomadas. Há, contudo, algumas notas a adicionar a este propósito.

A primeira nota é sobre a necessidade de esclarecimentos da opinião pública por parte da PGR.

Existem a este respeito várias abordagens possíveis. Uma delas é a que se adopta nos Estados Unidos da América, onde tudo é muito público, a PGR local advoga em público as suas posições, convoca a imprensa para filmar o arguido a ser passeado com algemas, e cria um “circo” à volta do processo criminal, tão bem descrito pelo recentemente falecido autor Tom Wolfe no seu magnífico livro A Fogueira das Vaidades. Outra abordagem é a do total secretismo. Não se sabe nada, não se diz nada, só depois de produzida uma acusação é que se levanta o véu sobre os factos. Há ainda a abordagem portuguesa, em que os processos são declarados secretos, mas depois, por algum “milagre”, tudo é tornado público através de fugas de informação cirúrgicas colocadas na imprensa (tudo é secreto e tudo é público!).

Angola começa a confrontar-se com estas questões, devido à anunciada “cruzada contra a corrupção e impunidade” anunciada por João Lourenço. No presente momento, em Angola, já não basta fazer discursos. Existe uma opinião pública suficientemente atenta e interessada, e cada vez em maior número, que exige ir além dos discursos e saber o que se está a passar. É neste ponto que interessa a actuação pública da PGR.

A magistratura não se pode refugiar no segredo dos processos e não informar a população sobre o que se passa, sobretudo nos casos de grande interesse público, como este, ou aqueles que envolvem as figuras grandes do regime: Zenú, Manuel Vicente, Isabel dos Santos, Jean-Claude Bastos de Morais, etc. Há um dever fundamental de informar a população sobre o que se passa.

Por outro lado, quer para salvaguardar a eficiência da investigação criminal, quer por razões da salvaguarda dos direitos individuais, não se pode divulgar tudo a todos a todo o tempo.

Assim, é dentro deste espaço que a PGR deverá actuar: informar a população sobre os grandes casos, não prejudicando a investigação e mantendo alguma contenção quanto às imputações feitas aos arguidos.

Aplicando esta regra ao caso em análise, a PGR deveria logo ter informado a população que tinha instaurado um processo-crime, realizado interrogatórios, imputado determinados crimes a certas pessoas e colocado uma delas em prisão preventiva, realçando as expectativas que tem em relação aos casos.

Não se deve seguir o exemplo português, em que a PGR local emite uns comunicados que ninguém percebe e depois existem “fugas” para os jornais que explicam tudo. Deve-se ir mais além do que em Portugal, e explicar o básico em comunicados de imprensa da PGR.

Obviamente, a primeira experiência de divulgação de um processo-crime pela PGR – a da suposta tentativa de burla dos 50 mil milhões que envolveria o general Nunda – correu mal. Foi uma verdadeira trapalhada. Mas esse mau exemplo deve servir de aprendizagem, e não para silenciar a PGR.

Ficam-se a aguardar esclarecimentos públicos da PGR sobre a evolução dos processos referentes a Zenú, Jean-Claude Bastos de Morais, Walter Filipe e Manuel Vicente, assim como acerca da eventual instauração de processo de investigação à administração de Isabel dos Santos na Sonangol.

É deixando entrar o sol na obscuridade da justiça angolana que se pode desinfectar e garantir a sindicância do verdadeiro empenho no combate à corrupção e à impunidade.

No presente momento, a população tem o direito fundamental de ser informada, e as autoridades o dever de informar.

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