O Medo e a Luta Pós-Eleitoral

E já está: no dia 6 de Setembro, o regime consumou o roubo das eleições, anunciando resultados em que ninguém acredita.

Em reacção, a CASA-CE convocou uma conferência de imprensa em que sublinhou que o escrutínio foi uma votação para a mudança, considerando que os resultados anunciados pela CNE estão eivados de vícios, e rejeitando os resultados eleitorais. Para que seja reposta a verdade eleitoral, anunciou que vai usar os meios democráticos previstos na Constituição, designadamente o recurso ao Tribunal Constitucional.

Por sua vez, Adalberto Costa Júnior, presidente do Grupo Parlamentar da UNITA, afirmou na SIC (canal de televisão português) que nenhum partido reconhece os resultados anunciados, porque eles não representam qualquer apuramento devidamente efectuado. Está assim lançada uma crise sem fim à vista, já que claramente a contagem dos votos desrespeitou a lei. E basta ver que os resultados provisórios e definitivos são exactamente iguais, até à centésima, pelo que se conclui facilmente que são fabricados em “laboratório”, acrescentou. Assim, também a UNITA vai recorrer ao Tribunal Constitucional.

No entanto, Adalberto Costa Júnior recusou utilizar a expressão “fraude eleitoral” para qualificar as eleições. Só que a pergunta impõe-se: se não houve fraude, houve o quê?

Finalmente, sete comissários da CNE ligados aos partidos da oposição também convocaram uma conferência de imprensa depois do anúncio dos resultados definitivos das eleições gerais de 23 de Agosto. Estes comissários afirmaram que o país “está numa encruzilhada, porque a lisura, a transparência e a validade do processo eleitoral estão em causa”. E de seguida apresentaram 15 pontos que elencam as irregularidades essenciais verificadas no processo eleitoral. Desde logo, declararam que o apuramento dos votos foi ilegal porque não se realizou de acordo com a lei, nem se baseou nos documentos oficiais exigidos pelas normas eleitorais. Acrescentaram que a solução tecnológica apresentada se lhes afigurava suspeita.

Queixaram-se também que a CNE impediu que, enquanto membros integrantes desta, exprimissem a sua opinião na forma de declaração de voto. Ora, isto seria um instrumento fundamental para explicarem as razões do seu voto vencido, além de permitir que a sua opinião discordante da maioria fosse tornada pública.

Portanto, os partidos da oposição e os comissários por eles designados não têm dúvidas em afirmar que o escrutínio eleitoral é inválido e apresentam provas consistentes para fundamentar essa invalidade.

Que não restem dúvidas a ninguém: estas eleições foram roubadas ao povo pelo MPLA.

Contudo, os mesmos partidos que denunciam com veemência as irregularidades eleitorais acabam por se conformar com elas. Anunciam que a sua reacção é recorrer ao Tribunal Constitucional. Tal seria correcto, se o Tribunal Constitucional não fosse um tribunal político composto por uma maioria clara nomeada pelo MPLA, em que um dos seus juízes mais destacados já se pré-pronunciou acerca dos resultados, no famoso artigo “Favas contadas”. São, de facto, “favas contadas” para o MPLA as decisões que o Tribunal Constitucional toma. Não adianta recorrer para o Tribunal Constitucional, ou, melhor dizendo, é importante recorrer para o Tribunal Constitucional, mas apenas para o obrigar a mais uma decisão juridicamente insustentável, e assim mostrar à opinião pública a deferência completa deste órgão face ao poder político.

No entanto, este recurso não é a solução para o roubo eleitoral.

Adalberto Costa Júnior tem medo de chamar “fraude” às eleições. Este medo condena a oposição a ser sempre trucidada pelo MPLA, que já sabe que a oposição fará uns “barulhinhos” e depois se calará.

Assim, tem que ser a sociedade civil a gritar bem alto: houve roubo eleitoral.

Como dizia o papa João Paulo II aos polacos que se queriam libertar do jugo comunista: “Não tenham medo!” Diz o povo a Adalberto: “Não tenhas medo!”

O que é que a oposição sem medo devia fazer? Inspirar-se nos representantes do Terceiro Estado francês. Em 1789, o rei Luís XVI não lhes reconheceu a representatividade que tinham: foram reunir-se na sala do jogo de pela, declarando-se como Assembleia da Nação.

Em Angola, os deputados da oposição deviam reunir-se de acordo com o número de votos que tenham apurado e que correspondesse à verdade eleitoral. Essa assembleia da verdade deveria, então, traçar um calendário de auscultação da sociedade, para que houvesse uma agenda nacional das forças patrióticas pugnando pela defesa dos interesses da maioria dos angolanos. Os deputados eleitos têm direito a ser deputados, todos, aqueles que foram reconhecidos pelo MPLA e os que não foram. Mais importante do que isso é ouvir o povo, respeitar os seus direitos e a sua vontade, algo que o MPLA nunca soube fazer e pelo qual não demonstra o mínimo interesse.

Cabe à oposição dar o próximo passo pacífico, e esse é reunir-se em assembleia com todos os seus deputados e ouvir o povo. A Assembleia Nacional do MPLA é um túmulo para o exercício da cidadania, o respeito pelos direitos e pela dignidade dos angolanos. É onde os dráculas do poder fazem os seus festins com o sangue que sugam do povo e este lhes concede.

A vontade popular é soberana. Que a oposição saiba representar a vontade soberana do povo.

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