Os Manifestos da UNITA, MPLA e CASA-CE

A leitura dos Manifestos Eleitorais pelas principais forças políticas concorrentes às eleições gerais de 23 de Agosto é um exercício de comédia alucinada.

Dos três partidos em jogo, apenas a UNITA trata o povo angolano com seriedade. Mesmo não se concordando com todas as medidas, começa por reconhecer a gravidade da situação e explicar as medidas que propõe.

O manifesto do MPLA é uma longa apresentação de metas realizada por algum Estaline dos trópicos. Não é um manifesto eleitoral, é uma lista interminável de objectivos a atingir. Poder-se-ia dizer que o programa do MPLA é uma carta de desejos ao Pai Natal. O MPLA diz o que pretende alcançar, mas não explica como, nem por que meios.

O manifesto da CASA-CE apresenta 220 ideias. Umas boas, outras más, outras que não se percebem. O que é que quer dizer a primeira ideia, “Consagrar a Terra como propriedade originária do Povo e não do Estado”? Ou a 210.ª ideia, “Melhorar as condições de intermodalidade da cadeia logística, através do tráfego de mercadorias por via ferroviária, rodoviária, marítima e aérea”?

O MPLA definiu como mote para estas eleições “Melhorar o que está bem, corrigir o que está mal”. O problema deste mote é que o MPLA conduziu Angola em 2017 a uma situação em que nada está bem, portanto, não há nada a melhorar e tudo a corrigir.

Talvez a única situação favorável seja o “Oxigénio da Paz”, para usar as imortais palavras do embaixador-itinerante António Luvualu de Carvalho. Mas na realidade só saberemos se o MPLA trouxe efectivamente o “Oxigénio da Paz” quando um dia este partido sair do governo e entregar o poder pacificamente a outro partido. A alternância democrática é, de resto, o grande teste à paz e ao MPLA.

Portanto, se há tudo a corrigir, para quê confiar em quem levou Angola à situação dramática em que se encontra?

Vejamos as propostas do MPLA. Tanto quanto se percebe, o MPLA quer erradicar a fome e combater a pobreza. Aparentemente, tal combate faz-se através de programas governamentais, que devem consistir na atribuição de subsídios sociais aos pobres. Ora, isto não esclarece quais as medidas reais, exactas, concretas que estão em cima da mesa para erradicar a fome e reduzir “a taxa de incidência da pobreza”. Tudo se resume à alusão a uns programas governamentais, e isto é igual a nada.

O candidato do MPLA a presidente da República, general João Lourenço, repete inúmeras vezes que deseja “promover e estimular a competência, a honestidade, assim como desencorajar o amiguismo e compadrio no trabalho”. E enfatiza: “O MPLA reafirma neste programa de governação o seu compromisso na luta contra a corrupção, má gestão do erário público e o tráfico de influências.” Em quem está a pensar João Lourenço quando faz estas afirmações? No seu antecessor? Na filha do seu antecessor? Era interessante perceber do que fala João Lourenço quando fala do combate à corrupção em Angola. Quem são os corruptos em Angola para João Lourenço? Da resposta a esta pergunta depende a seriedade das afirmações vagas que profere contra a corrupção. Por outro lado, quais os instrumentos que pretende utilizar para combater a corrupção? Convidar o procurador-geral da República para presidente da Alta Autoridade contra a Corrupção? Ou pedir ajuda à Polícia Federal Brasileira e ao FBI?

O que se consegue extrair do programa de governo divulgado pelo MPLA são ideias gerais e considerações abstractas. Naquilo que vimos não há propostas concretas, não há inovação nem concretização de ideias, apenas metas a atingir.

De facto, no que diz respeito ao MPLA, o seu programa é a sua prática governativa. Não são papéis. O que fez o MPLA, sobretudo nos últimos cinco anos? Para onde levou o país? Este é o verdadeiro programa do MPLA. E a resposta é óbvia.

Estudar mais, para servir melhor

Quanto à UNITA, o seu manifesto é inteligente, bem escrito e bem pensado. Contém Quatro Eixos Estratégicos, em que se destacam Sete Medidas de Emergência Nacional: 1. Governo Inclusivo, Nova Cultura de Governação; 2. Programa Integrado de Emergência Nacional; 3. Combate à Fome e à Pobreza (CFP); 4. Igualdade de Oportunidades; 5. Reestruturação da Economia; 6. Pluralismo na Comunicação Social; 7. Valorização da Família.

Estas medidas são amplas, abrangentes e bem-estruturadas em muitos casos. Não há dúvida de que se trata de um documento trabalhado e estudado.

Contudo, nesta fase da História de Angola, talvez fosse necessário um documento mais curto, incisivo e focado.

As eleições que se aproximam não acontecem numa situação normal, num país normal. Acontecem num país em crise profunda, que pode sair de uma ditadura e da miséria. Talvez devesse ser esse o ponto a realçar pela UNITA.

O manifesto da CASA-CE reúne um conjunto de 220 ideias. O grande problema deste manifesto é que não explica suficientemente os objectivos que a CASA-CE pretende alcançar, nem menciona as estratégias para os alcançar. Na realidade, não há uma coerência interna nas propostas da CASA-CE.

Vejamos o modo como este partido aborda a corrupção. Propõe a CASA-CE a criação urgente de uma “Alta Autoridade contra a Corrupção”.

Acontece que isso já foi feito: a Lei n.º 3/96 criou a Alta Autoridade contra a Corrupção, aprovada pela Assembleia Nacional. O problema é que o presidente José Eduardo dos Santos e o MPLA se recusaram sempre a instituir esse órgão. Por sua vez, a oposição, em particular a UNITA, nunca fez do assunto um cavalo de batalha e deixou cair o assunto. A CASA-CE está, portanto, a propor que se crie uma entidade que já está prevista na lei. Em vez disso, deveria estudar o referido diploma legal e apresentar ideias sobre: como lutará, na Assembleia Nacional, para o seu cumprimento; sobre quais as figuras capazes de liderarem a Alta Autoridade contra a Corrupção com independência e integridade; bem como sobre a sua harmonização com o quadro jurídico-institucional vigente.

É preciso notar que não basta criar instituições no papel. Enquanto a mentalidade – quer dos políticos, quer da sociedade – não se modificar no sentido do rigor e da exigência, será impossível implementar as mudanças necessárias ao desenvolvimento do bem comum em Angola.

A UNITA também precisa de estudar atentamente a legislação que existe sobre a corrupção. O partido do Galo Negro promete ratificar a Convenção da ONU contra a Corrupção. Ora, essa Convenção foi já ratificada em 2006 pelo Governo do MPLA e incorporada no direito angolano através da resolução 20/06 da Assembleia Nacional. A UNITA votou a favor dessa resolução, mas esqueceu-se, prometendo agora fazer o que já foi feito.

É fundamental estudar os assuntos antes de falar sobre eles (ou queremos ser todos o João Pinto?).

 

Poderíamos continuar a percorrer as 220 ideias da CASA-CE para constatar a vacuidade da maioria delas. Não vale a pena. Ficam uns exemplos:

– “Criação de um fundo de solidariedade social”: o que é isto? Para que serve?
– “Implementar uma gestão macroeconómica rigorosa, saudável e transparente que garanta as condições necessárias para a rentabilidade do investimento privado e para a promoção do equilíbrio social”: em que se traduz esta ideia?

Analisados os manifestos, a conclusão essencial é que constituem expressões de ideias ou de desejos razoavelmente inconsistentes e que não reflectem as necessidades e a realidade angolanas.

Há três matérias, acima de todas as outras, que têm de ser focadas em Angola:
– A pobreza e o desenvolvimento económico para todos;
– A juventude e o seu futuro concreto;
– A justiça e o combate à corrupção.

Um programa de mudança deveria focar-se nestes aspectos essenciais:
– Como garantir o crescimento económico de Angola para todos?
– Como garantir educação e oportunidades para a imensidão de jovens?
– Como lidar com a corrupção que vandaliza o país e com os agentes de justiça, como o PGR-General, que não funcionam e se dedicam a perseguir opositores políticos?

Finalmente, dever-se-ia estipular um calendário de 100 dias para a implementação inicial destes três aspectos.

Há que conferir um sentido de urgência à capacidade de mudança na liderança do país.

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