João Melo: O Novo “Engraxador Intelectual” de João Lourenço

João Melo, antigo deputado, jornalista, político, escritor e militante do MPLA, publicou recentemente um artigo de opinião no Jornal de Angola intitulado “Mudanças, sim, ‘revolução’, não“.

Segundo ele, nem a UNITA nem a CASA-CE, que na sua óptica são os partidos mais representativos da oposição, se encontram em condições de governar e de protagonizar as mudanças que a sociedade angolana pretende ver materializadas. O seu argumento é que nenhum dos dois partidos tem quadros suficientes e com a experiência necessária para isso. Nada mais falso.

Fui militar das FAPLA – o braço armado do MPLA – e hoje sou oficial das Forças Armadas Angolanas no activo. Pela experiência de guerra que tivemos, posso afirmar, sem medo de errar, que a UNITA tem capacidade para governar, e bem, o país. Nos anos de conflito armado, a UNITA deu-nos provas mais do que suficientes do seu poder de organização político-militar e administrativa, o que lhe permitiu levar a cabo uma guerra que durou mais de 25 anos. Reduzir a UNITA a um simples movimento de guerrilha é de uma enorme soberba.

É essa soberba que hoje domina o MPLA e que explica a arrogância com que João Melo vem a público colocar o seu partido nos píncaros e tentar convencer os eleitores de que não existe alternativa. A verdade é que o MPLA está há 42 anos no poder e nunca quis ou nunca conseguiu protagonizar mudanças políticas, sociais e económicas indispensáveis a uma qualidade de vida mínima para os angolanos. São décadas de promessas por cumprir, a que se juntam as da presente campanha eleitoral.

Um dos grandes males que fizeram com que o país chegasse ao nível de degradação actual foi o facto de se ter reduzido a cidadania à militância partidária, promovendo-se a mediocridade em detrimento da competência. De todo o modo, os quadros angolanos não são quadros do MPLA. Angola não é uma coutada do MPLA, pelo que ter um governo inclusivo – como sugere a oposição – não implica necessariamente que se tenha de contratar quadros das fileiras de outros partidos, mas sim da sociedade no seu todo. A inclusão também não deve implicar a militância partidária, como acontece hoje com o MPLA (um simples director de uma pequena escola primária tem de ter cartão partidário).

Ao contrário do que sugere João Melo, muitos dos quadros de que o país precisa para impulsionar as mudanças e o desenvolvimento já se encontram nas estruturas do Estado, e nenhum governo de oposição prescindirá desta força de trabalho.

Antes de reunir condições para poder mudar o país, o MPLA tem de se mudar a si a próprio. E cabe ao povo sofredor induzir essa mudança, expulsando-o do governo, para devolver ao país a dignidade que se perdeu com a longa governação criminosa sob a liderança do MPLA.

Acreditar que o MPLA pode transformar-se, dando-lhe mais um voto de confiança nestas eleições, é o mesmo que esmurrar continuadamente a ponta de uma faca.

Com o seu verbo, João Melo torna-se o novo “engraxador intelectual” do putativo sucessor de José Eduardo dos Santos, o general João Lourenço.

Na sua anterior crónica no Jornal de Angola, o escritor refere que só a vitória do MPLA e de João Lourenço garantirão que não haja caos em Angola. É a velha tese descabida segundo a qual Angola sem o MPLA é o apocalipse, a guerra. Só falta João Melo afirmar, qual evangelizador, que João Lourenço é a reencarnação de Jesus Cristo.

O escritor do MPLA destaca a “coragem” do candidato para combater a corrupção. Desde que foi revelado, recentemente, o saque de biliões de dólares do Banco de Poupança e Crédito por dirigentes, familiares e amigos do MPLA, não ouvimos ainda uma posição do “corajoso” ou do seu “engraxador” João Melo.

Por fim, o pedido de desculpas que João Melo exige da UNITA pela guerra,  procura normalizar a ideia de que o MPLA tem todo o direito de matar e roubar os angolanos, ao passo que os outros, se o fizerem, são assassinos e ladrões. O  MPLA nunca se desculpou a ninguém pelos horrores do 27 de Maio e nem sequer teve o pudor de ouvir os protestos dos familiares das vítimas assassinadas, que continuam até hoje sem esclarecimentos sobre o paradeiro dos corpos. E isto para citar apenas o massacre mais conhecido da história de Angola pós-independência.

Com indisfarçável racismo, João Melo procura caracterizar a UNITA como sendo  “prisioneira do Programa de Muangai [Programa de fundação da UNITA, em 1964], que preconiza a criação de uma ‘República socialista negra africana’”.  No tempo de partido único, a revisão da Lei Constitucional de 1986, imposta pelo MPLA,  introduziu a “edificação do Socialismo” como desiderato da nação angolana. Portanto, o que incomoda João Melo é a negritude que se afirmava em 1964 e com justa causa. O defensor do MPLA que se explique melhor sobre o seu problema racial.

O MPLA, ao nível da sua liderança, não deixa de ser uma associação de ladrões, mas nunca vimos João Melo a bater-se contra a corrupção. Essa corrupção que mata anualmente milhares de angolanos privados de serviços de saúde e de saneamento básico. Antes pelo contrário, o escritor sempre apoiou este estado de coisas.

Quando Angola passar por uma verdadeira mudança, os crimes de guerra do MPLA e da UNITA deverão ser investigados para um processo de catarse nacional. Os autores e mandantes desses crimes deverão responder ou ser devidamente identificados perante uma Comissão de Justiça e Reconciliação.

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