Kalupeteka: A Investigação Necessária de um Massacre

“Eles deviam divulgar os vídeos que filmaram durante o massacre. É só vergonha.”, conta Raul Xavier, seguidor de Kalupeteka e sobrevivente dos confrontos do Monte Sumi. Acrescenta, referindo-se aos seus companheiros: “Pediram-lhes para cantarem o hino que estávamos a cantar no momento em que iniciou o tiroteio. Depois [os polícias] despejaram-lhes em cima uma rajada. No dia seguinte, começaram a matar todos os feridos e sobreviventes que encontravam.” Raul Xavier é um sobrevivente daquilo a que chama o massacre do Monte Sumi, mas, mais do que isso, é uma testemunha ocular. E aquilo que viu impõe uma reflexão e exige uma acção.

Acontecimentos em que forças da ordem disparam tiros em rajada e é assassinado um número significativo de pessoas exigem uma investigação formal, sobretudo quando surgem testemunhas oculares a afirmar que presenciaram um massacre. Não é uma palavra fácil, é uma palavra incómoda.

Nos últimos meses, têm-se sucedido casos impressionantes de prepotência por parte das forças de segurança, diante dos quais é revelada a impotência – para não dizer pior – das autoridades judiciais. Chegar a hora de exigir intervenção imediata a outro nível.

Angola aderiu à Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos em 1990. Essa Carta instituiu a Comissão Africana dos Direitos do Homem e dos Povos. Esta Comissão tem por objectivo “promover os direitos do Homem e dos povos” e “assegurar a respectiva protecção em África”; é composta por 11 peritos independentes.

A Comissão recebe queixas por parte de Estados e de outras entidades, designadamente particulares, e tem o dever e a obrigação de escrutinar essas queixas. Quer os Estados quer os indivíduos em nome particular, obedecendo a determinados requisitos que constam da Carta, podem dirigir-se à Comissão; caso se suspeite de que as suas queixas referenciam ou indiciam um conjunto de violações graves ou maciças dos direitos do homem, a Comissão tem de alertar a Conferência dos Chefes de Estado e de Governo para tais situações. Por sua vez, a Conferência entenderá se deve solicitar à Comissão “que proceda, quanto a essas situações, a um estudo aprofundado e que a informe através de um relatório pormenorizado, contendo as suas conclusões e recomendações”. Não se pode dizer que seja um mecanismo juridicamente muito operativo, mas tem a grande vantagem de levantar a discussão em África, entre africanos, dos problemas subjacentes aos direitos humanos em Angola – sobretudo a identificação da ocorrência de um massacre, que poderá depois ser referenciado para o Tribunal Penal Internacional, que já dispõe de competências coactivas e mais abrangentes.

É, portanto, absolutamente necessário que as organizações da sociedade civil e de protecção dos direitos humanos que operam em Angola levantem a questão da ocorrência de um massacre, já denominado massacre do Monte Sumi, junto das instâncias africanas, para que isso conduza à instauração das investigações adequadas, de modo a apurar-se e compreender-se exactamente o que se passou.

É um dever passar à acção e requerer à Comissão Africana dos Direitos Humanos a investigação do massacre do Monte Sumi.
   

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