Convite a Jornalistas Estrangeiros é Crime em Cabinda

O presidente do conselho provincial de Cabinda da Ordem dos Advogados de Angola e um comerciante local foram acusados pelo Ministério Público (MP) angolano de recrutarem jornalistas estrangeiros para cobrirem uma manifestação anunciada para aquela província, em março último.

Segundo a acusação, a que a Lusa teve ontem acesso, em causa está o caso da manifestação, frustrada, contra a alegada má gestão e violação dos direitos humanos na província e que levou à condenação a seis anos de prisão, a 14 de setembro, pelo crime de rebelião, do ativista Marcos Mavungo, como pretenso organizador do protesto, classificado na condenação como uma ação violenta.

Marcos Mavungo foi detido a 14 de Março, dia da anunciada manifestação, tendo o mesmo acontecido com Arão Tempo, de 52 anos, representante em Cabinda da Ordem dos Advogados de Angola, e o comerciante Manuel Biongo, de 57 anos.

Estes dois foram libertados em Maio, sob termo de identidade, e só a 22 de Outubro foram notificados da acusação do MP, enquanto Marcos Mavungo permanece detido, tendo o seu advogado anunciado que iria recorrer da condenação.

A acusação contra Arão Tempo e Manuel Biongo refere que incorreram "na prática de um crime de colaboração com o estrangeiro para constranger o Estado angolano", na forma tentada, e em concurso com um crime de rebelião, conforme previsto na Lei dos Crimes Contra a Segurança do Estado.

Refere ainda que os dois foram "incumbidos" de irem receber "jornalistas estrangeiros com o intuito de se reportar para o estrangeiro 'o banho de sangue' que se previa que viesse a ocorrer'" naquela mesma manifestação, de 14 de Março.

"Os arguidos tentaram a todo o custo colaborar com estrangeiros para obrigar o Estado angolano a sujeitar-se à ingerência externa em prejuízo da sua independência ou soberania nacionais", lê-se na acusação, entregue no Tribunal de Cabinda, com data de 14 de Outubro.

No dia da detenção, refere o MP, os dois deslocaram-se ao posto fronteiriço de Massabi, junto à República do Congo, com o "propósito" da "criação de condições de recepção de dois jornalistas estrangeiros" e para "trazê-los à cidade de Cabinda, para cobertura de uma manifestação", que "havia sido proibida pelas autoridades competentes", três dias antes.

A acusação refere também que a Polícia Nacional acompanhou de perto os dois homens até avançarem para a detenção de ambos no posto fronteiriço de Massabi, quando estes "aguardavam pela chegada dos referidos jornalistas que viriam de Ponta Negra, República do Congo".

Esses jornalistas deveriam deslocar-se a Cabinda, prossegue a acusação, para fazer "a cobertura da manifestação" que os arguidos "previam" poder "desembocar em confrontos violentos com as forças da Polícia Nacional".

As autoridades garantem que o exame ao telemóvel de Arão Tempo permitiu detetar "mensagens com conteúdo estimulando a violência e a apelar ao ódio por si enviadas com dizeres 'A marcha será realizada amanhã. E que só poderá ser travada com a força das armas ou baionetas'".

"Vêm amanhã os jovens do Movimento Revolucionário e alguns jornalistas", afirma o MP, sobre o conteúdo de outra mensagem de telemóvel que suporta a acusação.

Este conteúdo demonstra, segundo a acusação, "o seu inequívoco envolvimento direto [no caso de Arão Tempo] em todo o processo de incitamento à violência" sobre a manifestação e continham "conteúdo apelativo a instigação à guerra civil ou à rebelião e visavam criar um clima de instabilidade e caos na província de Cabinda".

A acusação refere ainda, para suportar a posição, que Consulado angolano em Ponta Negra, República do Congo, "confirmou" ter recebido no início do mês de Março "um número elevado de pedidos de vistos de cidadãos estrangeiros incluindo jornalistas para entrarem na província de Cabinda".

Ainda não é conhecido despacho de pronúncia do Tribunal de Cabinda, face à acusação recebida, nem datas para o início do julgamento, permanecendo ambos os arguidos em liberdade, mas com movimentos condicionados.

 

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