Esposas e Irmãs dos Presos Políticos Oferecem Flores aos Polícias

“Vocês não podem fazer uma aglomeração deste género, mesmo de duas pessoas. Estão expressamente proibidos”, disse o oficial da polícia, exigindo a dispersão de cinco mulheres que conversavam com dois jornalistas e um político junto à paragem de autocarro, a mais de 200 metros do Largo da Independência, em Luanda.

Minutos antes, o mesmo oficial e os seus agentes encarregaram-se de expulsar Elsa Caholo (Irmã de Osvaldo Caholo), Esperança Gonga (esposa de Domingos da Cruz), Lídia Kivuvu (irmã de Arante Kivuvu), Marcelina de Brito (irmã de Inocêncio de Brito) e Henriqueta Diogo (esposa de Benedito Jeremias) do banco da paragem de autocarro onde se encontravam sentadas, à espera. Tratava-se de inviabilizar a manifestação convocada pelas mães, esposas e irmãs dos 15 presos políticos, acusados de preparação de um golpe de Estado contra o presidente José Eduardo dos Santos, que celebra hoje o seu 73º aniversário.

Estranhamente, outras pessoas tinham permissão para se sentarem na paragem do autocarro. No largo, o MPLA fazia a sua manifestação com música ao vivo, em apoio ao presidente. “O MPLA é amigo do povo angolano”, cantava um dos artistas convidados. Inicialmente ocupado por crianças, o largo depressa ganhou uma moldura humana interessante. O Maka Angola identificou entre os presentes, um grande número de activistas que, não tendo encontrado espaço para se manifestarem, discretamente convergiram no largo. Laurinda Gouveia, Rosa Conde, Raul Mandela, Emiliano Catumbela, Roberto Gamba “Pastor”, Mário Faustino, entre muitos outros veteranos das manifestações, ali estavam, em paz.

Laurinda Gouveia e Rosa Conde hoje, no Largo da Independência, são as únicas mulheres ouvidas no caso dos 15 presos políticos.

Nas bancadas junto ao Largo da Independência, carregando cartazes do MPLA de apoio ao presidente, também se aglomeravam pessoas em festa, com música bastante alta.

Pela primeira vez naquele largo, agentes da segurança e manifestantes policiavam-se mutuamente, num sobe e desce pelas ruas, como se de uma comédia se tratasse. Os manifestantes procuravam oportunidades para se “aglomerarem”, e os agentes tinham a missão de os impedir que se juntassem em “aglomerado”, a palavra que entrou no léxico das manifestações.

A dado momento, as familiares dos presos políticos acima mencionadas decidiram pegar em ramos de flores – margaridas – , deram a volta ao largo e ofereceram-nas aos oficiais da Polícia que encontravam na rua.

“Quando entregávamos as flores, dizíamos ‘Liberdade Já’”, relatou Lídia Kivuvu.

Perante esta iniciativa inesperada e original, as reacções foram de perplexidade ou desconcerto. “Primeiro, alguns rejeitavam. Diziam que estavam fardados e não podiam receber flores porque não sabiam a sua origem e o que vinha atrás [o objectivo daquele gesto]”, contou Lídia Kivuvu.

“Outros diziam que não podiam receber porque estavam de serviço e não podiam ter nada nas mãos”, acrescentou Henriqueta Diogo.

Arlete Ganga, irmã do malogrado Manuel Heriberto de Carvalho Ganga assassinado pela guarda presidencial em 2013, que se juntara ao grupo, pediu então a um dos oficiais que colocasse o pé de margarida no bolso. Quando este a questionou sobre o sentido da oferta, ela respondeu: “É pela Liberdade, já.”

“As flores brancas significam a paz e a pureza”, enfatizou Arlete Ganga, em solidariedade aos 15 presos políticos.

Momentos depois, um grupo de oito activistas, entre os quais se incluía o conhecido Baixa de Cassanje, tentou chegar ao largo gritando “Liberdade Já”, com um cartaz, mas foi imediatamente rechaçado. Numa fracção de segundos, formou-se uma multidão de agentes policiais e de segurança, à paisana, à volta do grupo.  

Imagem do Largo da Independência, o epicentro das disputas entre o regime os grupos de jovens que lutam pelo exercício pleno do direito de manifestação.

Vários agentes de segurança agarraram Raimundo Fixe, confiscaram-lhe o telefone e tentaram levá-lo dali, sob escolta policial e sob fortes protestos dos outros activistas. Foi tratado a bofetadas.

Nessa altura, o jornalista da Rede Angola, Borralho Ndomba, tentou fotografar o acto, tendo sido imediatamente cercado por agentes policiais e de segurança, que lhe confiscaram também os telemóveis, para visionarem e apagarem as imagens indesejadas. Devolveram-lhe os telefones depois de confirmarem a inexistência de registos da repressão.

Carlos Francisco “Revolucionário Mil”, de 22 anos, foi agarrado por três agentes à paisana, pelos pés e pelas mãos, protegidos por agentes da Polícia Nacional. Aspergiram-no com uma mistela nos olhos, e encheram-no de bofetadas. O autor deste texto testemunhou o episódio.

Quando o levavam, agarrado pelos pés e pelas mãos como se de um saco se tratasse, um agente da Polícia Nacional perguntou: “Para onde levamos o Revolucionário Mil?” Um dos outros agentes respondeu laconicamente: “Vamos despejá-lo aí, mais à frente.”

Adália Chivonde, mãe do preso político Nito Alves, levou o seu apito para o Largo da Independência.

Entretanto, a mãe do preso político Nito Alves, Adália Chivonde, contou ao Maka Angola como começou a ser perseguida a partir de casa no dia anterior.

“Hoje a polícia mandou-me parar em Viana, quando ia à cidade para a manifestação, para me revistar”, denunciou.

“A minha filha perguntou-lhes porque me revistavam daquela maneira, até nos panos que trazia vestida. Ela perguntava-lhes se eu estava a esconder armas nos panos ou coisas para destruir o país ou o presidente. Não entendia a falta de respeito”, partilhou Adália Chivonde, que tinha inclusive preparado o seu apito para a manifestação.

 

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